Dierdre. Fechou os olhos e tentou, sem sucesso, afastar esse pensamento. O seu peito apertou-se ao sentir que os tinha desapontado.
A única coisa que fazia Alec continuar, que o abanava do seu desânimo, era sentir que ele era necessário noutros lugares, como Sovos tinha insistido; que ele tinha um destino certo, que ele poderia usá-lo para ajudar a destruir os Pandesianos noutro lugar. Afinal, como Sovos havia dito, ter morrido lá atrás com o resto deles não teria ajudado ninguém. Ainda assim, ele esperava e orava para que Marco e Dierdre tivessem sobrevivido e que ele ainda pudesse voltar a tempo para se reunir com eles.
Muito curioso para saber para onde se dirigiam, Alec tinha inundado Sovos com perguntas, mas este tinha permanecido teimosamente em silêncio, sempre no leme noite e dia, de costas para Alec. Ele nem sequer, tanto quanto Alec sabia, havia dormido ou comido. Apenas ficava ali a olhar o mar com as suas botas de couro altas e casaco de couro preto, com as suas sedas escarlates drapeadas sobre o seu ombro, vestindo uma capa com a sua curiosa insígnia. Com a sua curta barba castanha e olhos verdes brilhantes, que olhavam para as ondas como se fossem só um, o mistério em torno dele aprofundava-se.
Alec olhava admirado para o fora do comum Mar das Lágrimas, com a sua cor de água clara, sentindo-se tomado por uma urgência em saber para onde estava a ser levado. Incapaz de suportar o silêncio por mais tempo, ele virou-se para Sovos, desesperado por respostas.
"Porquê eu?", perguntou Alec, quebrando o silêncio, tentando mais uma vez e desta vez determinado a obter uma resposta. "Porquê escolher-me de entre toda aquela cidade? Porque é que eu era o único destinado a sobreviver? Poderias ter salvado uma centena de pessoas mais importantes do que eu."
Alec esperou, mas Sovos permaneceu em silêncio, de costas para ele, estudando o mar.
Alec decidiu ir por outro caminho.
"Para onde é que estamos a ir?", perguntou, ainda assim, mais uma vez. "E como é que este navio é capaz de navegar tão rápido? Do que é que é feito?"
Alec observava as costas do homem. Passaram-se minutos.
Finalmente, o homem abanou a cabeça, ainda de costas.
"Estás a ir para onde estás destinado a ir, para onde estás destinado a estar. Eu escolhi-te a ti porque nós precisamos de ti e de mais nenhum."
Alec indagava-se.
"Precisam de mim para quê?", pressionou Alec.
"Para destruir a Pandesia."
"Porquê eu?", perguntou Alec. "Como é que posso eventualmente ajudar?"
"Tudo ficará claro quando chegarmos", respondeu Sovos.
"Chegarmos onde?", pressionou Alec, frustrado. "Os meus amigos estão em Escalon. As pessoas que eu amo. Uma miúda."
"Eu sinto muito", suspirou Sovos, "mas ninguém é deixado lá trás. Tudo o que tu em tempos conheceste e amaste foi-se."
Seguiu-se um longo silêncio e, no meio do assobio do vento, Alec rezou para que ele estivesse errado – apesar de, no fundo, ele sentir que ele estava certo. Como é que a vida podia mudar tão rapidamente?, questionava-se.
"No entanto, estás vivo", continuou Sovos, "e isso é um presente muito precioso. Não o desperdices. Podes ajudar muitos outros, se passares no teste. "
Alec franziu a testa.
"Que teste?", perguntou.
Sovos finalmente virou-se e olhou para ele com um olhar penetrante.
"Se fores o tal", disse ele, "a nossa causa vai cair nos teus ombros; se não fores, não teremos nenhuma função para ti".
Alec tentou entender.
"Estamos a navegar há dias e ainda não chegámos a lado nenhum", Alec observou. "Cada vez mais em alto mar. Eu já nem consigo ver Escalon."
O homem sorriu.
"E onde achas que estamos a ir?", perguntou.
Alec encolheu os ombros.
"Parece que navegamos para nordeste. Talvez algures na direção de Marda."
Alec estudou o horizonte, exasperado.
Finalmente, Sovos respondeu.
"Como estás errado, meu jovem", respondeu ele. "Completamente errado, na verdade."
Sovos voltou-se para o elmo e uma forte rajada de vento levantou-se. O barco encaminhou-se para os carneirinhos do oceano. Alec olhar para além dele e, ao faze-lo, pela primeira vez, ele ficou surpreendido ao vislumbrar algo no horizonte.
Ele correu para a frente, cheio de emoção e agarrou a amurada.
Ao longe, surgia lentamente uma massa de terra, que apenas começava a tomar forma. A terra parecia brilhar, como se fosse feita de diamantes. Alec levantou a mão para os olhos, espreitando, imaginando o que poderia ser. Que ilha poderia existir ali no meio do nada? Ele deu voltas à sua cabeça, não se conseguindo lembrar de nenhuma terra nos mapas. Seria algum país do qual ele nunca tinha ouvido falar?
"O que é?", perguntou Alec apressadamente, olhando fixamente para lá, em antecipação.
Sovos virou-se e, pela primeira vez desde que Alec o conhecera, ele sorriu largamente.
"Bem-vindo, meu amigo", disse ele, "às Ilhas Perdidas."
CAPÍTULO SETE
Aidan ficou confinado a um poste, incapaz de se mover, enquanto observava o seu pai, ajoelhando-se a alguns passos diante dele, ladeado por soldados Pandesianos. Ali estavam, de espadas levantadas, segurando-as por cima da sua cabeça.
"NÃO!", gritou Aidan.
Ele tentou libertar-se, para avançar e poupar o seu pai. No entanto, independentemente de quanto tentasse, ele não se conseguia mover, com as cordas a afundarem-se nos seus pulsos e tornozelos. Ele foi forçado a assistir quando o seu pai se ajoelhou ali, com os olhos cheios de lágrimas, a olhar para ele a pedir ajuda.
"Aidan!", gritou o seu pai, estendendo-lhe a mão.
"Pai!", gritou-lhe Aidan também.
As lâminas desceram e, um momento depois, o rosto de Aidan ficou salpicado de sangue quando eles cortaram a cabeça do seu pai.
"NÃO!", gritou Aidan, sentindo a sua própria vida a desmoronar-se dentro dele, sentindo-se a afundar dentro de um buraco negro.
Aidan despertou com um sobressalto, ofegante, coberto de um suor frio. Ele sentou-se na escuridão, lutando para perceber onde estava.
"Pai!", gritou Aidan, ainda meio a dormir, à procura dele, ainda sentindo a urgência de salvá-lo.
Ele olhou ao redor, sentiu algo no seu rosto e cabelo, por todo o corpo e percebeu que era difícil respirar. Estendeu a mão, puxou algo leve e longo da sua cara e percebeu que estava deitado num monte de feno, quase enterrado nele. Rapidamente sacudiu tudo enquanto se sentava.
Estava escuro ali, apenas o fraco cintilar de uma tocha que aparecia através das ripas de Madeira. Rapidamente ele apercebeu-se que estava deitado na parte traseira de uma carruagem. Ouviu um barulho ao lado dele. Viu com alívio que era Branco. O enorme cão saltava na carruagem ao lado dele e lambia-lhe a cara, enquanto Aidan o abraçava.
Aidan respirou com dificuldade, ainda dominado pelo sonho. Tinha parecido muito real. Teria o seu pai realmente sido morto? Ele tentou lembrar-se de quando o vira pela última vez, no pátio real, emboscado, cercado. Ele lembrava-se de o ter tentando ajudar e, depois, de ter sido levado por Motley no meio da noite. Ele lembrava-se de Motley o ter colocado naquela carruagem e de terem cavalgado pelas estreitas ruas de Andros para fugir.
Isso explicava a carruagem. Mas onde tinham eles ido? Para onde o tinha levado Motley?
Uma porta abriu-se e uma lasca da luz das tochas iluminou o escuro espaço. Aidan foi finalmente capaz de ver onde estava: numa pequena sala de pedra, o teto baixo e arqueado, parecendo uma pequena cabana ou taberna. Ele olhou para cima e viu Motley de pé na porta, enquadrado na luz das tochas.
"Continua a gritar assim e os Pandesianos vão encontrar-nos",