Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, empresas, organizações, lugares, eventos e incidentes são produto da imaginação da autora ou foram usados de maneira fictícia. Qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou falecidas, é mera coincidência. Imagem da capa Copyright Nejron Photo, usada com autorização da Shutterstock.com.
CONTEÚDO
“Aproxima-te querido guerreiro e eu conto-te um conto.
Um conto de batalhas distantes.
Um conto de homens e valentia.
Um conto de coroas e glória.”
--As crónicas esquecidas de Lysa
CAPÍTULO UM
Ceres corria pelos becos de Delos, numa grande excitação, sabendo que não poderia atrasar-se. Apesar de o sol estar quase a nascer, o ar abafado cheio de poeira já sufocava na antiga cidade de pedra. Com as pernas a queimar e os pulmões a doerem-lhe, ela, ainda assim, esforçou-se por correr ainda mais rápido, saltando por cima de um dos inúmeros ratos que rastejavam para fora das sarjetas e do lixo nas ruas. Ela já conseguia ouvir o ribombar distante. O seu coração palpitava em antecipação. Algures lá à frente, ela sabia, o Festival da Matança estava prestes a começar.
Com as mãos a arrastarem-se ao longo das paredes de pedra enquanto se contorcia e virava pelos estreitos becos, Ceres olhou para trás para se certificar que os seus irmãos ainda a estavam a acompanhar. Ficou aliviada ao ver Nesos, nos seus calcanhares, e Sartes, apenas a alguns passos atrás. Aos dezanove anos, Nesos era apenas dois ciclos solares mais velho do que ela, enquanto Sartes, o seu irmão mais novo, era quatro ciclos solares mais jovem, à beira de deixar de ser uma criança. Ambos, com os seus longos cabelos cor de areia e olhos castanhos, eram exatamente iguais um ao outro - e iguais aos seus pais – porém, nada parecidos com ela. Ainda assim, apesar de Ceres ser uma miúda, eles nunca tinham sido capazes de a acompanhar.
"Despachem-se!", Ceres gritou para trás.
Ouviu-se outro ribombar e, apesar de ela nunca ter ido ao festival, ela imaginava-o com detalhes vívidos: toda a cidade, todos os três milhões de cidadãos de Delos, lotando o Stade naquele feriado de solstício de verão. Seria diferente de tudo o que ela já tinha visto e se os seus irmãos e ela não se apressassem não restaria um único assento.
Ganhando velocidade, Ceres limpou uma gota de suor da testa e limpou-a à sua desgastada túnica marfim, que era da mãe dela. Nunca ninguém lhe havia dado roupas novas. De acordo com a sua mãe, que idolatrava os seus irmãos e parecia reservar um ódio e inveja especiais por ela, ela não o merecia.
"Espera!", gritou Sartes, com uma voz estridente, ligeiramente irritado.
Ceres sorriu.
"Devo levar-te ao colo, então?", gritou-lhe ela.
Ela sabia que ele odiava quando ela o provocava, porém o seu comentário sarcástico iria motivá-lo a conseguir acompanhá-la. Ceres não se importava que ele a seguisse; ela achava encantador que ele, aos treze anos, fizesse qualquer coisa para ser considerado o seu par. E mesmo que ela nunca o chegasse a admitir abertamente, ela precisava fortemente que ele precisasse dela.
Sartes grunhiu ruidosamente.
"A mãe vai matar-te quando descobrir que lhe desobedeceste novamente!", gritou ele.
Ele estava certo. Ela iria fazê-lo certamente – pelo menos, iria dar-lhe um bom açoite.
Quando a sua mãe lhe bateu pela primeira vez Ceres tinha cinco anos e aquele foi o verdadeiro momento em que ela perdeu a sua inocência. Até então, o mundo havia sido divertido, amável e bom. Depois disso, nada tinha voltado a ser seguro e ela apenas se conseguia agarrar à esperança de um futuro onde iria conseguir afastar-se dela. Agora, ela era mais velha e tenaz.