Barbara Cartland

O Duque e a Corista


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      —Concordo com a senhorita. É por ter a maior admiração e respeito por seu pai que prefiro que ele morra em seu própria leito.

      —E eu também… mas… não há outra solução?

      Lentamente e escolhendo bem as palavras, o médico explicou-lhe, como havia explicado a Harry, que a única esperança era pagar um cirurgião como Sheldon Curtis, que empregava os métodos de Lister, a fim de impedir que o ferimento de uma operação cirúrgica não se infeccionasse.

      —Já ouvi falar do Dr. Lister e papai mostrou-se muito interessado no trabalho que ele tem levado a cabo em Edimburgo.

      —Com efeito, é algo de revolucionário! Imagino não lhe ser possível conseguir duzentas libras, pois é do que necessito, a fim de recorrer aos serviços profissionais do Dr. Curtis…

      —Seria impossível para nós. Os parentes de papai já morreram quase todos e aqueles que ainda estão vivos são tão pobres quanto nós. Como o senhor sabe, esta casa é alugada e não possuímos nada de valor que possamos vender.

      —Éo que eu imaginava.

      —Papai ainda está no meio de seu último livro e, mesmo que acabasse, duvido que os editores lhe fizessem um grande adiantamento. As coisas que escrevem nos jornais a respeito de papai são muito lisonjeiras, mas ele não consegue vender seus livros por serem profundos demais. Poucas pessoas querem ler a respeito da época medieval ou até mesmo seu tratado sobre o Rei Artur, um herói lendário que sempre me fascinou.

      —E a mim também, quando tenho tempo de pensar nele!

      O médico olhou para Larentia e constatou o quanto era bela. Katie King possuía aquela beleza exuberante que se associa ao palco, e, quando estava bem, seus olhos brilhantes, a boca vermelha e sorridente e o nariz arrebitado faziam todos os homens voltarem a cabeça, a fim de contemplá-la.

      Larentia Braintree era um tipo diferente de beleza. Seus traços possuíam a perfeição clássica e seus olhos, que irradiavam reflexos esverdeados, eram suaves e gentis, conferindo a seu rosto uma espécie de beleza espiritual com que o médico ainda não havia deparado.

      Ficou intrigado, pensando se seus cabelos seriam tão compridos quanto os de Katie King, mas dominou-se, dizendo a si mesmo que era ocupado demais para ter tempo de pensar em jovens, por mais atraentes que fossem.

      —Preciso voltar a trabalhar, Srta. Braintree. Desculpe-me por lhe trazer notícias tão negativas. Gostaria de ser otimista e dizer-lhe que seu pai haverá de recuperar-se.

      —Ele não pode ficar sabendo. . . Dir-lhe-ei que o senhor tem certeza de que em breve voltará a levantar-se. Quando vier nos visitar, da próxima vez, não se esqueça de dizer-lhe o mesmo.

      —A senhorita é uma filha digna do pai que tem. Admiro-a tanto quanto o admiro e farei tudo o que estiver a meu alcance a fim de impedi-lo de sofrer.

      —Muito obrigada.

      Reprimiu um soluço, mas seus olhos estavam úmidos. Enxugou as lágrimas e acompanhou o médico até a porta, antes de ir até a cozinha preparar o café que seu pai tanto apreciava, enquanto trabalhava.

      Pegou do chão o papel que o professor havia derrubado e colocou-o diante dele. Sentou-se em uma cadeira, encarando-o como se o visse pela primeira vez.

      Ninguém tem um pai tão distinto, pensou ela. Seus cabelos grisalhos modelavam-lhe o rosto enérgico. Seus traços pareciam pertencer a um homem de uma outra era e sempre a fascinavam. Podia entender perfeitamente o fato de a mãe ter se apaixonado por ele, quando se encontraram pela primeira vez. Seu pai sentira o mesmo.

      —Sua mãe era muito bela— ele dissera centenas de vezes a Larentia, quando conversavam a respeito da mulher que ambos haviam amado—, tinha sangue húngaro e acho que isto contribuía para a beleza dos cabelos dela, que eram semelhantes aos seus, porém um pouco mais escuros.

      —Ela me parecia uma princesa de contos de fada. Lembro-me de que, quando vocês iam jantar fora, eu costumava pensar que as pessoas paravam na rua, a fim de olhá-los.

      O professor riu e em seguida disse, muito sério:

      —Pode imaginar o que significava para mim não possuir nada de valor, a não ser meu cérebro, quando sua mãe disse que se casaria comigo?

      —Lembro-me de ela ter contado isto. Disse-me também que a única coisa que importava no mundo era o amor. Sentia-se muitas vezes milionária pelo fato de o senhor a amar.

      Notou o quanto suas palavras haviam agradado ao professor.

      —Trabalhei bastante hoje, mas agora sinto-me um pouco cansado, Larentia.

      —Tome o café, papai, e tente repousar. A tarde está linda e quero sentar-me no jardim, mas não demorarei muito, caso precise de mim.

      —Você não vai sair sozinha para a rua, a esta hora…

      —Claro que não, papai. Prometi que jamais faria uma coisa destas.

      —Devia ter sempre alguém em sua companhia, mas como faremos para pagar uma criada, no momento? Quando terminar este livro, tenho certeza de que fará mais sucesso do que os outros. Minha nova pesquisa sobre o rei Artur é bem diferente das que realizei antes. Acho importante que Alfred Tennyson tome conhecimento do que descobri recentemente.

      —Parece-me que o Sr. Tennyson mora na ilha de Wight desde que se casou— observou Larentia, com frieza.

      Não queria que seu pai soubesse o quanto a magoara o fato de Alfred Tennyson, o célebre homem de letras, ter consultado o professor, visitando-o continuainente, enquanto trabalhava na obra Os idílios do Rei.

      Ao terminar o livro, olvidou totalmente a assistência recebida do maior dos especialistas no assunto. Seu pai ficou magoado diante da indiferença do homem cujo trabalho admirava e nunca mais tocou no nome de Alfred Tennyson. Ocorreu no entanto a Larentia que poderia solicitar sua ajuda.

      A carga da Brigada Ligeira devia ter proporcionado uma fortuna ao Sr. Tennyson. Sabia que “O Santo Graal e outros Poemas”, tinha sido publicado naquele ano, mas não tinha meios de adquirir um exemplar para seu pai.

      Acho que Alfred Tennyson, esqueceu-se completamente da existência de papai, disse a si mesma, com amargura.

      Ao contemplar o semblante sereno e belo de seu pai, pensou que não devia preocupá-lo ou amargurá-lo com a traição de seus amigos ou inimigos.

      —Quando tiver descansado, papai, trarei o jantar e, enquanto estiver comendo, lerei em voz alta o que o senhor escreveu hoje. Tenho certeza de que será muito interessante.

      —Você sempre me encoraja, querida!

      Ao retirar a xícara e colocá-la na bandeja, pensou que ele, de fato, se encontrava muito fatigado e o esforço de escrever tornava-se cada dia maior.

      —Não está sentindo dor, papai? — perguntou, sentindo dificuldade em enunciar tais palavras.

      —Somente um pouco. Não é nada.

      Larentia manteve-se em silêncio. Atravessou o quarto, fechando um pouco a veneziana. Enquanto descia a escada, carregando a bandeja, ouviu que batiam à porta da frente e ficou imaginando quem poderia ser.

      «Imagine só se for uma carta dos editores, comunicando a papai que venderam inesperadamente muitas cópias de seu último livro!» pensou.

      Sabia, porém, que aquilo não passava de uma fantasia.

      O livro que ele escrevera sobre o Rei Artur, traduzido do inglês para galês, o “Y Gododdin”, não tinha um único exemplar vendido há um ano, o que significava que o público não se mostrava interessado.

      Quando pisou o último degrau, a batida se fez ouvir novamente, e caminhando em direção à porta, Larentia, se perguntava quem demonstraria tamanha pressa, a ponto de não ter um mínimo de paciência para esperar

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