Ares, que depois de ter animosamente discutido com a Irene tinha-se afastado com Afrodite, notou aquela sombra suspeita e, agarrada pela garganta, fez andar aos tombos a indesejada deusa por toda a parte lateral ocidental do monte Pelio, intimidando-a para não voltar mais.
Mas o canto de Apolo e vozearia calorosa dos participantes acresceu a raiva e a indignação de Eris até ao ponto que esta ultima forjou um diabólico plano das mais insuspeitadas e imprevisíveis consequências...
A Discórdia foi até aos confins da terra, ali onde Atlante, irmão de Prometeu, tinha sido relegado a suster a volta celeste culpado por ter participado na guerra dos Gigantes contra Zeus. Na horta das julianas/Hespérides, filhas de Atlante, cresciam as árvores dos pomos de ouro; Eris colheu por engano o pomo mais bonito e com ele logo regressou em Tessália.
Chegou ao banquete já quando os festejos encaminhavam-se para o seu fim e os convidados, um por um, faziam exibicionismo das prendas trazidas aos noivos: Poseidon ofertou a Peleu dois lindíssimos cavalos, Balio e Xanto, os mais velozes do mundo, dotados de palavras e de previdências, Era ofereceu a Tétis um magnifico peplo historiado bordado, Afrodite ofereceu uma taça de bronze e um diadema de ouro, Atena uma flauta de ouro, Hermes uma carroça de bronze e marfim, uma pesada lança de flechas em bronze.
Assim, enquanto todos admiravam as feições daqueles estupendos brindes, Eris conseguiu intrometer-se na festa e esconder-se num canto obscuro onde ninguém podia vê-la mas suficientemente próximo para poder lançar sobre a mesa, já quase vazia, o “pomo da discórdia” que tinha há pouco roubado às filhas de Atlante.
Não obstante que fosse pouco lúcido pelas 99 gotas de vinho bebidas na competição com Dionísio, Zeus foi o primeiro a dar-se conta do pomo; ele conhecia bem aqueles frutos e, antes que todos os outros lançassem inevitavelmente o olhar sobre aquele extraordinário fruto sentenciou: “é da horta das Hespérides!”.
De repente todos, inclusive os noivos, foram capturados por aquele pomo que sobressaia no centro da mesa e alguém supôs que fosse um outro presente para aquelas inesquecíveis núpcias.
Sempre Zeus notou que naquele fruto havia uma escrita, mas o vinho absorvido lhe impedia de distinguir perfeitamente as letras e então mandou o pomo para Atena, a mais douta entre os deuses, pedindo-lhe para ler a escrita para todos. Atena não hesitou e leu a curiosa mensagem: “Para a mais bela”, reenviando o fruto ao seu pai para que decidisse ele a quem destiná-lo.
Estava, certa que o seu marido não tivesse tido dúvidas, nem custou muito ao apresentar as suas razões de esposa e primeira deusa a fim de apoderar-se daquele extraordinário presente. Logo depois interveio Afrodite, recordando a Zeus que não é por acaso que lhe pertencia o título de deusa da beleza. Enfim avançaram outras deusas e ninfas, todas com razoáveis argumentações, mas no fim a terceira candidatura reuniu-se em volta de Atena que, além da corporeidade estatuária, vangloriava também uma beleza interior e intelectual indiscutível.
Na tal contenda, até Zeus manifestou o seu embaraço e, quando o murmúrio cresceu à desmedida até tornar-se disputa, emitiu um grito poderoso como cem raios, deixando a todos mudos. Encolerizado e titubeante deu alguns passos distanciando-se do banquete deixando a Temes, deusa da justiça, o fardo da escolha.
Temes, por sua vez, depois de ter convencido a todos que cada um tinha as próprias boas razões e que ninguém entre os presentes estava em condições de julgar objectivamente uma vez que, quem por um motivo, quem por um outro, envolvido emocionalmente, por cima do cargo recebido, sentenciou: “A escolha caberá a Páris do monte Ida, aquele que será o mais lindo entre os homens”.
Só agora, Zeus, que não via a hora de fazer passar com o repouso a bebedeira acusada, exprimiu a sua paterna aprovação para com o sentenciado e decretou definitivamente concluída a questão.
Assim, depois de vários anos, quando Páris alcançou a máxima beldade juvenil, as três deusas candidatas, precedidas por Hermes, partiram em direcção do monte Ida.
O julgamento de Páris e o regresso à Tróia
Durante a viagem Afrodite, sem o conhecimento das outras deusas, conseguiu seduzir Hermes e surripiar deste o segredo de Páris, desvendado naquela noite ao deus pelo seu filho Pan: o jovem pastor era na verdade Alexandre, príncipe de Tróia, filho de Príamo e Hécuba. Ele foi abandonado ao seu nascimento no monte Ida pelos seus progenitores, visto que um adivinho tinha a eles profetizado que aquele filho seria a causa da queda de todo o reino de Tróia. O Rei Príamo, incapaz de provocar com sua manu a morte do filho, ordenou que fosse deixado naquele monte conhecido de todos pelos invernos rigorosos e pela presença de feras ferozes.
A criança mandada ao encontro da morte certa que foi amamentada e protegida por uma grande ursa e sucessivamente cuidado e criado por uma família de pastores e que nas mãos desta cresceu forte e lindo, a mesma, a tinha descoberto seguindo a ursa até ao covil e fortuitamente descobriu também a cesta do recém-nascido.
Quando Hermes e as três deusas alcançadas por Páris, estas estavam na sombra de um carvalho tocando a sua fistula de sete tubos, reparando com satisfação o rebanho, ignorando a incrível visita.
Manifestando-se diante do jovem, Era começou dizendo que, sendo seu, o privilégio de distribuir riqueza e poder aos mortais, se ele tivesse recebido tal prémio teria feito de Páris o mais rico e poderoso dos homens.
Atenas, pelo contrário, em troca do pomo oferecia inteligência, sabedoria e valor na vida e na guerra.
No fim apareceu Afrodite, bela mais do que nunca; explicou a Páris que ele já possuía tudo o que as suas concorrentes lhes ofereciam visto que ele na realidade era filho de pai rico e poderoso e na sua natureza já tinham todos preexistentes os carismas prometidos e que muito em breve lhe revelariam a sua nobre origem. Afrodite, pelo contrário, teria oferecido a ele o amor da mulher mortal mais linda, cujo nenhum homem poderia resistir à primeira vista.
Páris entreabriu os olhos, viu com a mente riqueza e poder, ficou fascinado pela suprema sabedoria, mas à imagem de Helena, a mulher prometida por Afrodite, não pôde não apaixonar-se instantaneamente e o resto dissolveu-se como as nuvens com o sol; ele abriu naquele momento os olhos e, enfim obcecado por amor, sem nenhuma hesitação deu o pomo nas mãos de Afrodite, não despreocupado pelo desdém e pelas ameaças de Era e Atenas que, derrotadas, sumiram.
Hermes correu de imediato para informar a Zeus da escolha de Páris, enquanto Afrodite prometia ao jovem pastor que muito em breve conheceria a sua nobre estirpe e o amor; deveria contudo correr para recuperar a roupa que envolvia na cesta o seu corpo de infante e partir o mais rápido possível para Ílio, a esplêndida capital chamada também Por Tróia; lá se inscrevera aos jogos do reino pelos quais estava em jogo o touro gordo que antes os soldados do rei tinham-no confiscado ao gado daquele que o julgava seu pai.
Páris, encantado e estupefacto, obedeceu sem delongas e, com uma rústica lança, um arco e a sua característica fístula, chegou finalmente em Tróia, a “cidade dos muros de ouro”. Ela nascia sobre uma amena colina entre o Helesponto e o mar Egeu. Aos pés da colina corriam dois rios, o Scamandro a ocidente e o Simoenta a norte.
Lá, com Afrodite ao seu lado, bateu, um depois do outro, todos os participantes ao torneio, sob o olhar dos soberanos e do príncipe Heitor, o mais forte e valoroso herói troiano.
No momento da distinção, o vencedor aproximou-se ao palco real para receber a investidura e a bênção de Príamo, mas, quando ficou a uma dezena de passos da cadeira do rei, a princesa Cassandra emitiu um estridente grito de desgraça; Príamo e a sua senhora gelaram, reconhecendo só naquele momento a roupa que aquele jovem trazia em vida; só então concretizam exactamente que aquele deselegante pastor vindo do monte Ida, armado de simples armas mas capaz de bater todos os mais fortes nobres troianos, não podia que ser o seu amado filho Alexandre, abandonado entre as lágrimas há vinte anos.
Tróia foi festa durante 7 dias e 7 noites e, não obstante a inicial