vinha abraçar,
Fiquei-lhe d’um salto
Suspensa no ar.
Amores, amores.
Deixál-os dizer;
Se Deus me deu flôres,
Foi para as colher.
Eu tenho um moreno,
Tenho um de outra côr,
Tenho um mais pequeno,
Tenho outro maior.
FABULA
Um dia os deuses, cada qual uma arvore,
Á sua guarda consagraram: Jupiter
Esse o carvalho, a murta Venus, Hercules
Lá esse o alemo, e o loureiro Apollo.
Vendo-as Minerva todas infructiferas:
Que é isto? exclama. Jupiter acode-lhe:
Senão, diriam, filha! que as guardavamos
Só pelo fructo.– Que me importa digam-no;
É pelo fructo que a oliveira escolho.
Minerva! brada o pai d’homens e deuses,
És quem, de todos, sabes mais sem duvida;
No que não luza… mal fundada gloria.
Honra sem proveito
Faz mal ao peito.
Phedro.
Coimbra.
BOAS NOITES
Estava uma lavadeira
A lavar n’uma ribeira,
Quando chega um caçador.
– Boas tardes, lavadeira!
– Boas tardes, caçador!
– Sumiu-se-me a perdigueira
Alli n’aquella ladeira,
Não me fazeis o favor
De me dizer se a bréjeira
Passou aqui a ribeira?
– Olhai que d’essa maneira
Até um dia, senhor,
Perdereis a caçadeira,
Que ainda é perda maior.
– Que me importa, lavadeira!
Aqui na minha algibeira
Trago dobrado valor.
Assim eu fôra senhor
De levar a vida inteira
Só a vêr o meu amor
Lavar roupa na ribeira…
– Talvez que fosse melhor,
Vêr… coser a costureira!
Vir, de ladeira em ladeira,
Apanhar esta canceira
E tudo só por amor
De vêr uma lavadeira
Lavar roupa na ribeira…
É escusado, senhor!
– Boas noites… lavadeira!
– Boas noites, caçador!..
Messines.
GASPAR
Ora se não sei eu quem foi teu pai!
Fidalgo: sei perfeitamente bem.
O que eu não sei, Gaspar! é o que vem
N’esta vida fazer quem já lá vai.
Já se vê que é aos paes que a gente sái.
Tal pai, tal filho; sim, duvída alguem
Que um pai se é como o teu, homem de bem,
Tu és homem de bem como teu pai?
D’isto não ha quem possa duvidar.
Mas queres um conselho que eu te dou?
Não mexas n’isso… cala-te, Gaspar!
Que eu, cá por mim, bem sabes como eu sou,
Mas é que outro talvez mande tirar
Certidão de baptismo a teu avô.
Coimbra.
* * *
Deixa que ao romper d’alva o cravo abrindo,
Á rosa envie o aroma;
E lá quando alta noite a lua assoma,
O rouxinol carpindo!
Que pela face a lagrima resvale
De quem no exilio geme;
E quando a propria sombra o homem teme,
Que a mãi seu filho embale.
Deixa que ao espaço immenso os olhos lance
O sol antes que expire;
Que pelo norte a bussola suspire
E nelle só descance.
Amam leões e tigres. Não ha nada,
Anjo! que a amor se esconda.
Beija a pomba o seu par; e abraça a onda
A rocha inanimada.
Deixa que a nuvem negra tolde a lua
Se a leva a tempestade;
Deixa que eu te ame a ti, cara metade,
D’esta alma toda tua!
Coimbra.
CARTA
Maria! vêr-te á porta a fazer meia,
Olhando para mim de vez em quando,
É o que n’esta vida me recreia.
Acordo até de noite suspirando
Por que rompa a manhã e tenha o gosto
De te vêr já tão cedo trabalhando.
Desde pela manhã até sol-posto
Que não tens de descanço um só momento;
Por isso tens tão bella côr de rosto.
E eu pallido, Maria! O pensamento
Não é trabalho que nos dê saude,
Esta imaginação é um tormento.
Que bello tempo aquelle em quanto pude
Levar, como tu levas, todo o dia
N’essa vida chamada ingrata e rude!
Nunca soube o que foi melancolia,
Nunca provei as lagrimas salgadas
Com que a nossa alma as penas allivia;
Andava sim por essas cumiadas
Ao sol, á chuva, muita vez, sósinho,
Vendo os valles, das rochas escarpadas;
Descendo pelo córrego estreitinho,
De pontal em pontal, cortando o matto,
Pelas chapadas, fóra de caminho;
Mas não era que já o teu retrato
Me andasse a mim no coração impresso,
Onde hoje o trago no maior recato,
E