Só de pensar no que acabara de acontecer, ele podia sentir um pouco mais de energia nas suas pernas.
— Existe um lugar longe o suficiente para fugir do que estou sentindo? — A mente de Adam estava gritando, quando ele alcançou a porta quebrada que conduzia para a sala que outrora foi a biblioteca da escola, antes que o último terremoto tivesse tornando aquele lado do prédio impróprio para uso dois anos antes.
O diretor havia finalmente encontrado um prédio mais barato para construir uma nova biblioteca na ala leste, o que ele preferiu do que reforçar a ala norte e torná-la segura, então esse lugar estava sempre deserto agora.
Ainda abalado pelo beijo de Youra e pelo abraço de Arashi, Adam começou a abrir a porta do seu abrigo secreto… quase secreto, já que teve que dividi-lo com uma caloura no último ano.
Só quando entrou, ele se jogou no chão, segurando a cabeça entre as pernas e esperando que pudesse esquecer o que estava girando em sua mente há muito tempo.
Ele se lembrou da imagem de Youra. Linda Youra. Todo garoto em sua escola faria qualquer coisa para sair com ela, mas toda garota solteira em sua escola venderia a alma ao diabo para sair com ele.
Youra não demorou muito para procurá-lo e pedir para que ele fosse seu namorado e ele concordou só porque era o que todos seus amigos esperavam dele.
Até seu pai apertou suas mãos naquele momento, feliz e orgulhoso dele.
Mas quando ela tentou beijá-lo, ele ficou nervoso e começou a suar frio, enquanto sua cabeça e coração continuavam lembrando-lhe do sorriso de Arashi
— Por que Arashi? Youra é a garota certa para mim! Eu amo Youra! — Ele vinha dizendo a si mesmo há mais de dois meses, mas o sorriso de Arashi, seus abraços ou tapinhas nas costas foram suficientes para tornar Youra em ar impalpável se comparado ao brilho ensolarado de Arashi.
Ele vinha se perguntando até ficar exausto sobre os motivos do seu comportamento, mas sem resultados, até aquele dia pelo menos.
Era apenas algo tolo: alguém havia feito Arashi tropeçar e ele caiu nos braços de Adam, mesmo que apenas por alguns instantes.
Apenas por alguns instantes… mas foi o suficiente para fazê-lo correr para o banheiro para esconder a ereção evidente que pressionava a calça do seu uniforme escolar.
Que vergonhoso!
Ele teve que correr como louco para limpar aquele instinto censurável e impróprio da sua mente. Até a lembrança do corpo nu de Youra não foi capaz de desviar sua atenção disso.
— Por que tudo isso está acontecendo comigo? O que há de errado comigo? — Adam estava abatido e tentou reprimir aqueles sentimentos que pareciam sufocá-lo.
Ele ia desmoronar mais uma vez e dar vazão a lágrimas de frustração e vergonha, quando ouviu mais alguém gemendo dolorosamente na sala.
Ele já tinha ouvido isso várias vezes nos últimos dias, mas parecia muito mais desesperado desta vez.
Sentindo-se curioso e preocupado ao mesmo tempo, ele se levantou e moveu-se devagar até a estante onde os romances de fantasia costumavam ficar.
Sem fazer qualquer som, ele lançou um olhar entre os corredores até que conseguiu ver a garota chorando. Ela estava sentada no chão, como de costume, os braços ao redor dos joelhos que estavam dobrados até o peito e as pernas completamente nuas por causa da saia amarrotada. Ela estava chorando muito.
Ele apagou da mente o lema dos seus colegas de classe, dizendo que ninguém poderia abrir mão da chance de ver a calcinha de uma garota e se aproximou dela.
Assim que a garota percebeu que ele estava li, ela parou de chorar e de repente se levantou com um pulo, enxugando o rosto com a manga do uniforme.
— Pegue — Adam disse, entregando-lhe seu lenço.
A garota pegou o tecido branco com mãos trêmulas e temerosas e enxugou o rosto com cuidado.
— Obrigada… Você é Adam Gramell, não é?
— Sim e você é Kira Yoshida, não é? — conjeturou ele, fingindo não ter certeza da sua resposta, quando sabia perfeitamente quem a garota era. Embora ela fosse dois anos mais jovem do que ele e sempre parecesse tão infeliz, essa garota não conseguiu realmente escapar de nenhum radar masculino desde que entrou na escola um ano antes. Suas feições ocidentais apenas um pouco proeminentes atraíram imediatamente a atenção de todos. Seus pais vinham de dois grupos étnicos diferentes como os dele, mas o pai de Adam era americano e ele havia herdado seus olhos azuis, o que o tornava tão terrivelmente charmoso, além do corpo imponente e musculoso. Em vez disso, Kira tinha os olhos verdes escuros incomuns da mãe, enquanto seus cabelos compridos e lisos eram como os japoneses. Contudo, havia algo terrivelmente charmoso nela e sua expressão misteriosa, discreta e sempre triste a fez objeto da atenção de algum menino, mesmo se, certamente, ela se livrasse de todos eles muito rapidamente.
— Você me conhece?
— Pessoas mestiças como nós nunca passam despercebidas.
Essa declaração pareceu atingi-la, já que ele a viu sorrir pela primeira vez.
— Mas não sou a pessoa mais legal da escola como você: o famoso namorado de Youra Lee-Kuro, campeão de basquete, ídolo da escola e garoto da capa da Lovely .
— Uau! Não tinha percebido que era tão famoso! — interrompeu Adam, sentindo-se desconfortável.
— Não dá para evitar, se você aparece na capa da revista para garotas mais famosa. Você tem futuro como um ídolo — respondeu Kira. Ela sempre lia Lovely, desde que sua colega de classe, M i saki, lhe emprestasse.
— Isso foi há três meses.
— Você quer dizer que não vai se tornar um ídolo ?
— Exatamente! Nem agora nem nunca — declarou Adam com um sorriso muito amplo, que tentava esconder sua dor e tristeza por ter sido obrigado a desistir do seu sonho. Ele sempre se encantou com o mundo da moda e a ideia de se tornar um modelo o estimulou desde o começo.
Sua entrevista para a Lovely deveria ter sido a melhor plataforma de lançamento… pelo menos até seu pai acusar a revista de ter enganado seu filho com bobagens e ninharias gays. Ele havia gritado que preferia morrer do que ver o próprio filho andando como uma “aberração”, vestido com roupas “esquisitas” no meio de estilistas “esquisitos”.
— Tem uma vaga na Academia Militar para você, meu filho — seu pai disse com orgulho, já que abominava a possibilidade de que Adam pudesse fazer qualquer outra coisa com sua vida, que talvez não fosse algo muito “heterossexual”.
Ele nunca soube se era culpa dessas palavras ou seu pavor de ser marcado como homossexual pelo pai, mas ele começou a sair com Youra no dia seguinte e assumiram o namoro três dias depois.
Ele não se sentia feliz, mas estava com muito medo de procurar uma solução diferente.
— É uma pena. Não sei por quê, mas sempre pensei que você se tornaria um modelo quando crescesse… Provavelmente porque sempre vejo você desfilando pelos corredores da escola — disse Kira, trazendo-o de volta ao mundo real.
— Obrigado por suas palavras amáveis, mas já decidi seguir os passos do meu pai e me tornar um militar como ele.
De repente, a garota começou a chorar de novo e caiu aos seus pés.
— Ei, você está bem? Eu disse algo errado? — Adam ficou imediatamente assustado e se inclinou na frente dela.
— Odeio militares. — Kira mal conseguia soluçar.
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