Sara Craven

Confissões de amor


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Afinal, isso podia mesmo acontecer.

      E talvez ela pudesse por fim começar a esquecer o seu pesadelo secreto. Começar a viver a sua vida plenamente sem se martirizar com a recordação da vergonha que a transformara numa reclusa voluntária.

      Toda a gente cometia erros e era ridículo que levasse tão a sério aquele seu lapso. Embora fosse algo que nada tinha a ver com ela, não precisava de continuar a censurar-se por isso nem permitir que tal envenenasse a sua existência meses a fio.

      – Mas porquê? – perguntava-lhe Susie com frequência. – Está na hora de nos divertirmos, portanto, esquece os teus autores e os seus malditos manuscritos por uma noite e vamos sair as duas. Todos gostariam muito de te ver. Estão sempre a perguntar por ti.

      E Alanna utilizava invariavelmente a desculpa do trabalho, datas limite, cada vez mais responsabilidades… E a possibilidade muito real de a empresa ser comprada, o que levaria, quase inevitavelmente, a despedimentos.

      Explicava, de um modo muito razoável que, para garantir o seu emprego, tinha de dedicar-se plenamente a ele, o que para ela não era nenhum sacrifício porque adorava o que fazia.

      E, ainda por cima, tinha criado para si esta persona de profissional do escritório, uma mulher calada, dedicada e amavelmente distante. Prendia a sua nuvem de cabelo cor de mogno escuro com um gancho de prata na base da nuca. Tinha deixado de realçar os seus olhos verdes e as suas longas pestanas com sombra e rímel, restringindo o seu uso de maquilhagem a um toque de batom, mas tão discreto que parecia quase invisível.

      E só ela sabia a razão pela qual tinha adotado aquela camuflagem deliberada. Nem sequer tinha dito a Susie. Ela era a sua melhor amiga desde os tempos da escola e agora era também a sua colega de apartamento. Tinha-lhe proporcionado alegremente o refúgio que precisava para fugir do seu estúdio, que não passava de um quarto com cozinha dentro e uma casa de banho partilhada, e agora mostrava-se completamente deliciada com o aparente renascimento de Alanna.

      Embora não pensasse abandonar aquela versão atual de si mesma. Tinha-se habituado a ela e dizia-se que era melhor prevenir que remediar.

      E Gerard parecia gostar dela tal como ela era, embora talvez pudesse mudar um pouco de rumo sem o surpreender demasiado.

      Dependendo, claro, de como corresse tudo na festa da sua avó.

      O convite tinha-a surpreendido. Gerard era inegavelmente encantador e atento, mas a sua relação até ao momento podia qualificar-se de contida. Embora ela não tivesse nada a objetar quanto a isso, muito pelo contrário.

      No primeiro dia tinha aceitado jantar com ele porque se tinha posto em perigo para a salvar e teria parecido uma falta de educação recusar.

      E tinha descoberto que podia relaxar-se e desfrutar de uma noite agradável na sua companhia. Só ao terceiro encontro é que ele lhe deu um beijo de boa noite, até então limitara-se a roçar-lhe os lábios.

      Não tinha sido precisamente um beijo Martini, como lhe chamava Susie. Para seu alívio, Alanna não se tinha excitado. E ao mesmo tempo, dava-lhe confiança pensar que não tinha nenhuma objeção séria a ele voltar a beijá-la. E quando o fez, gostou de aperceber-se de que começava a gostar.

      – Andamos a sair junto – disse-se, um pouco divertida com a sua ideia de um cortejo antiquado, mas também agradecida. – E desta vez – acrescentou com fervor, – não meterei a pata na poça.

      De qualquer modo, era consciente de que o próximo fim de semana em Whitestone Abbey podia ser um ponto de inflexão na relação e que ela talvez não estivesse preparada para isso.

      Por outro lado, recusar o convite podia ser um erro ainda maior.

      Com essa ideia, gastara uma parte das suas poupanças num vestido azul marinho, cingido e que lhe chegava até aos tornozelos em camadas alternadas de seda e rendas, recatado o suficiente, na sua opinião, para agradar à avó mais exigente, mas que realçava ao mesmo tempo as suas estreitas curvas de um modo que Gerard poderia apreciar.

      E que usaria durante o coquetel do sábado para amigos e vizinhos e no jantar formal da família que decorreria a seguir.

      – Espero que não te aborreças mais que a conta – tinha-lhe dito Gerard. – Noutros tempos, a minha avó seria capaz de dançar toda a noite, mas acho que começa a sentir o peso da idade. Mas não imagines uma velhota de rendas com cheiro a lavanda. Ainda monta a cavalo todos os dias antes de tomar o pequeno-almoço, seja verão ou inverno. Tu montas a cavalo?

      – Já o fiz – tinha respondido ela. – Até de ter saído de casa para ir para a universidade e dos meus pais terem decidido mudar-se para uma casinha com jardim, uma que podiam tratar em vez de cuidarem de um prado imenso e de um estábulo.

      – Traz botas – tinha-lhe dito ele com um sorriso. – Emprestamos-te um chapéu e vou mostrar-te toda a zona como manda a lei!

      Alanna tinha-lhe retribuído o sorriso.

      – Isso seria maravilhoso – comentara, cada vez mais convencida de que a quase octogenária Niamh Harrington devia ser uma mulher formidável.

      Já para não falar do resto da família.

      – A mãe do Gerard é viúva e o seu falecido pai era o filho mais velho da senhora Harrington e o único varão – disse-lhe Susie nessa noite enquanto jantavam no apartamento. Contou com os dedos. – Depois há a sua tia Caroline e o tio Richard, com o seu filho e a sua esposa, mais a sua tia Diana, o seu esposo Maurice e as suas duas filhas, uma casada e a outra solteira.

      – Meu Deus! – murmurou Susie. – Espero, para o teu bem, que usem etiquetas com os nomes. Crianças?

      Alanna espetou uma gamba com o garfo.

      – Sim, mas com amas. Tenho a impressão de que a senhora Harrington não aprova os métodos modernos de educação das crianças. Também teve uma terceira filha chamada Marianne – acrescentou, – mas ela e o seu esposo morreram e não me parece que esperem que o filho assista à celebração.

      – Melhor assim – retorquiu Susie. – Já são demasiados – fez uma pausa. – O filho da Marianne é o dono da Bazaar Vert?

      Alanna encolheu os ombros.

      – Suponho que sim. O Gerard não me falou muito dele.

      – Parece-me que vai ser um fim de semana complicado – comentou Susie.

      As complicações, de facto, começaram na sexta-feira de manhã, na reunião de aquisições das sextas-feiras.

      Quando terminou, Alanna entrou no seu pequeno escritório, fechou a porta com o pé e praguejou.

      – Oh, Hetty! – murmurou. – Onde estás quando preciso de ti? – perguntou, embora soubesse perfeitamente que estava em licença de maternidade.

      De facto, era por isso que Alanna tinha sido promovida temporariamente a diretora da ficção romântica da editora Hawkseye na ausência da sua chefe.

      Ao princípio tinha adorado, mas tinha acabado por dar-se conta de que estava numa zona de guerra, onde o inimigo era Louis Foster, que dirigia a lista de ficção para homens, inclinada principalmente para a escola de pensamento de «sangue e entranhas», mas que incluía também algumas celebridades literárias e outras coisas mais, como Alanna acabava de descobrir.

      Tinha ido à reunião para vender uma autora nova, com um estilo fresco e uma perspetiva inovadora, que ela própria tinha descoberto.

      Tinha falado com entusiasmo da sua descoberta, mas tinha chocado com a determinação de Louis, que opinara que não poderia recomendar um investimento de tão alto risco numa completa desconhecida.

      – Sobretudo – tinha acrescentado, – porque o Jeffrey Winton me disse no outro dia, enquanto almoçávamos, que queria ampliar a sua linha editorial e o que sugeriu soa muito parecido ao que propõe a jovem da Alanna. E, claro, teríamos o nome de Maisie McIntyre, que se vende por si só.

      Jeffrey Winton era