tirar-lhe a vida,
Tirae-lhe a morte tambem.
Se mais tenho que perder,
Mais quero que me leveis,
Com tanto que me deixeis
Os olhos para vos ver.
Amores de huma casada,
Que eu vi pelo meu mal.
N'huma casada fui pôr
Os olhos, de si senhores:
Cuidei que fossem amores,
Elles fizerão-se amor.
Faz-se o desejo maior
Donde o remedio não val,
Em perigo de meu mal.
Não me paraceo que Amor
Pudesse tanto comigo,
Que donde entra por amigo,
Se levante por senhor.
Leva-me de dor em dor,
E de final em final,
Cada vez para mor mal.
Enforquei minha esperança;
Mas Amor foi tão madraço,
Que lhe cortou o baraço.
Foi a esperança julgada
Por sentença da Ventura,
Que pois me leve á pendura,
Que fosse dependurada:
Vem Cupido com a espada,
Corta-lhe cerce o baraço.
Cupido, foste madraço.
Puz o coração nos olhos,
E os olhos puz no chão,
Por vingar o coração.
O coração invejoso
Como dos olhos andava,
Sempre remoques me dava
Que não era o meu mimoso:
Venho eu de piedoso
Do Senhor meu coração,
E boto os olhos no chão.
Puz meus olhos n'huma funda,
E fiz hum tiro com ella
Ás grades d'huma janella.
Huma Dama, de malvada,
Tomou seus olhos na mão;
E tirou-me huma pedrada
Com elles ao coração.
Armei minha funda então,
E puz os meus olhos nella,
Trape, quebrei-lhe a janella.
De pequena tomei amor,
Porque o não entendi;
Agora que o conheci,
Mata-me com desfavor.
Vi-o moço e pequenino,
E a mesma idade ensina
Que s'incline huma menina
Ás amostras d'hum menino:
Ouvi-lhe chamar Amor,
Pelo nome me venci;
Nunca tal engano vi,
Nem tamanho desamor.
Cresceo-me de dia em dia
Com a idade a affeição,
Porque amor de criação,
N'alma, e na vida se cria.
Criou-se em mi este amor,
E senhoreou-se de mi:
Agora que o conheci,
Mata-me com desfavor.
As flores me torna abrolhos,
A morte me determina
Quem eu trouxe de menina
Nas meninas de meus olhos.
Desta mágoa e desta dor
Tenho sabido que emfim
Por amor me perco a mim
Por quem de mi perde amor.
Parece ser caso estranho
O que Amor em mi ordena,
Qu'em idade tão pequena
Haja tormento tamanho.
Sejão milagres d'Amor,
Hei-os de soffrer assi,
Até que haja dó de mi
Quem entender esta dor.
Apartárão-se os meus olhos
De mi tão longe.
Falsos amores,
Falsos, maos, enganadores.
Tratárão-me com cautella,
Por m'enganar mais asinha;
Dei-lhe posse d'alma minha,
Forão-me fugir com ella.
Não ha vê-los, nem ha vella,
De mi tão longe.
Falsos amores,
Falsos, maos, enganadores!
Entreguei-lhe a liberdade,
E, emfim, da vida o melhor;
Forão-se; e do desamor
Fizerão necessidade.
Quem teve a sua vontade
De si tão longe?
Falsos amores,
E oxalá enganadores!
Falso Cavalheiro, ingrato,
Enganais-me,
Vós dizeis, que eu vos mato,
E vós matais-me.
Costumadas artes são
Para enganar innocencias,
Piedosas apparencias
Sôbre isento coração.
Eu vos amo, e vós ingrato
Magoais-me,
Dizendo, que eu vos mato,
E vós matais-me.
Vêde agora qual de nós
Anda mais perto do fim,
Que a justiça faz-se em mim,
E o pregão diz que sois vós.
Quando mais verdade trato
Levantais-me
Que vos desamo e vos mato,
E vós matais-me.
Se de meu mal me contento,
He porque para vós vejo
Em todo o mundo desejo,
E