Nade!
A camisa flutuava ao seu redor, uma pálida mortalha, enquanto ele se afundava naquele abismo acolhedor.
Capítulo Dois
HAVIA DIAS EM QUE VIVER debaixo das ondas se provava surpreendente e excitante. Hoje não era um deles, por isso Ione tinha saído de casa. Para sempre. Bem, ela estava livre para sair sempre que quisesse, mas não pretendia voltar para o mar Egeu. Como várias das suas quarenta e nove irmãs antes dela, Ione finalmente tinha chegado ao seu limite e agora queria espaço. A parte ruim daquilo era que o oceano provia muito espaço.
Espaço demais, às vezes.
Na verdade, naquele momento, ela não tinha certeza em qual mar ou oceano tinha acabado, já que nadara sem rumo, sem prestar muita atenção ao que estava à sua volta enquanto estava perdida em sua cabeça, pensando no que faria agora. A água era muito mais fria que em casa, então era óbvio que ela tinha ido para o norte. Ou noroeste. Deveria ter prestado atenção…
Mordeu o lábio e olhou ao redor, então agitou a calda dourada abaixo dela até que ficou na vertical e olhou para cima. Um barquinho flutuava na superfície. Humanos eram sortudos por terem tanta liberdade na terra. Perigos para os mortais geralmente espreitavam por todos os lados na água. Na terra, o perigo era menor. Ao menos era o que pensava. Ione nunca tinha ido além da costa. Não se sentiria confortável sendo ela mesma em terra. Por causa da sua natureza. O que teria que fazer para se proteger se ficasse lá tempo demais…
Talvez devesse procurar a tal Ilha Desaparecida, o local que algumas de suas irmãs tinham procurado anos atrás. A ilha nunca permanecia no mesmo lugar duas vezes, e lhe daria mais segurança caso decidisse se acasalar. Talvez não precisasse afogar o macho humano que ela usaria para engendrar as suas filhas, se estivesse em algum lugar seguro. Algum lugar que não induzisse os humanos a caçar a sua espécie seja por medo, seja por curiosidade. Já estava mais que pronta para se acasalar com um homem, e não podia se obrigar a fazer isso. Além do mais, não queria matar alguém após um ato como aquele. Parecia… errado. E se ela gostasse de fazer aquilo com o humano e quisesse fazer de novo?
Ione sacudiu a cabeça tirando o cabelo do rosto enquanto executava o movimento. Ela não pertencia ao mundo humano, mas a perspectiva de afogar mortais tinha ajudado a mantê-la longe. Não tinha uma natureza violenta, e ninfas do mar eram quase todas fêmeas, somente uma parte delas tinha barbatanas como as dela. Seu primo, Tritão, filho e mensageiro de Poseidon, do mesmo jeito que Hermes era para Zeus acima das ondas, tinha a calda de barbatanas como as dela, e os filhos machos e fêmeas dele também as tinham. Ela poderia acasalar com um dos tritões machos, se quisesse, mas os primos nunca fizeram algo romântico por ela. Eles eram machos decentes, é claro, mas ela queria algo… diferente. Se algum dia acasalasse, queria alguém novo e estimulante. Alguém que não a lembrasse de sua criação. Que já não fosse da família. Alguém somente dela. Talvez um humano.
A família ficaria horrorizada se ela deixasse alguém viver para que pudesse usá-lo para seu prazer? O desejo percorreu o seu corpo quando pensou nisso. Ninfas precisavam de duas coisas da vida: o elemento do qual extraíam suas forças e sexo. Ela estava no mar há séculos, mas sexo… ela dava um jeito quando a necessidade surgia, mas precisava tomar uma atitude quanto àquela parte sua. Quanto mais a negava, mais miserável se sentia. E era por isso que não suportava mais ficar em casa. E, por fim, teve que ir embora. Precisava muito mais do que deveria desejar.
Uma pancada na água a fez voltar a olhar para cima. Um dos humanos tinha saltado na água. Que estranho. O meio da noite não parecia uma hora boa para nadar quando não se tinha barbatanas. Humanos não tinham a visão desenvolvida como a dela… ou guelras. Então por que ele faria uma coisa assim?
O mortal, um macho, continuava a afundar, mal movia um braço ou uma perna para dar impulso em direção à superfície ou ao barco, o qual estava flutuando para longe dele como se não tivessem percebido a sua partida. Ela arfou. Deuses, ele estava se afogando! Os companheiros o deixaram para morrer, de propósito? Por que fariam isso?
Antes de decidir o que fazer, ela moveu a calda mais rápido, deslizando para cima até que pegou o homem por baixo dos braços. Dividida entre o instinto de proteger o humano e de manter o segredo sobre a sua espécie a salvo dos outros, Ione se apressou com ele, indo na direção oposta à do barco. Ajudou o fato de o céu noturno estar oferecendo sombras à mesma proporção que a luz da lua as revelava. Sempre foi fascinada pelo brilho da lua, mas agora não era hora de se maravilhar.
Quando ela levou a cabeça dele acima das ondas, ele não estava respirando. Temendo tê-lo mantido lá embaixo por tempo demais, ela o reposicionou em um dos seus braços e levou a mão ao peito dele, sobre o coração, então a passou por baixo do tecido folgado da roupa dele. A carne estava fria ao toque, possivelmente por causa da temperatura da água e não por ser tarde demais. Canalizando a energia em sua mão, ela levou os lábios aos dele, sugando a água que ele inalara de volta para ela. Para que saísse do corpo dele. Quando a água salgada entrou em contato com seus lábios, ela se afastou enquanto ele tossia e expulsava a água do corpo.
Ione, então, olhou para ele e admirou a beleza masculina. Cabelos negros tinham se soltado do laço que ainda segurava uma porção deles amarrados na altura da nuca. Os olhos dele eram azuis, um azul deleitável para os sentidos superiores necessários para a vida abaixo da superfície. Ele tinha a mandíbula quadrada e uma estrutura facial agradável. Enquanto olhava para ela, ele piscou, quase que em descrença. Então ele se encolheu.
– Preciso dizer – disse entredentes com uma voz profunda que a fez tremer. – Eu esperava que o paraíso fosse menos… molhado. – E com aquilo, os olhos dele rolaram para trás e ele perdeu a consciência.
Os humanos eram tão frágeis.
Suspirando, ela o segurou e nadou em direção à costa. Ela podia ter um vislumbre de uma praia à distância, e esperava que a noite oferecesse privacidade suficiente para que o fato de ela estar acima da superfície não colocasse nem a ela, nem a seu povo, em risco. De qualquer forma, a emoção da aventura clamava por ela. E o desejo de acasalar zumbia em suas veias.
TUDO DOÍA. SE JAMES estivesse morto, não era para ele estar se sentindo mais leve? A menos que ele tenha ido para o inferno, o que não fazia sentido, porque estava certo de que tinha visto um anjo antes de voltar a apagar. Um belo anjo de cabelos dourados que tirou sua alma de dentro do oceano. Ela estava tão molhada quanto ele se sentia agora. Enquanto uma onda o atingia na nuca, seu corpo foi submergido e a água salgada desceu por sua garganta, fazendo os olhos e as narinas queimarem.
– Desculpa. – A voz era doce e melódica, e ele gemeu ao perceber que aquela mulher ainda estava com ele. Ela segurava James nos braços, toda aquela pele macia e sedosa se esfregava nele enquanto ela nadava com ele em direção à praia. Seu anjo. James se virou para olhar para ela. O cabelo dourado e perfeito, a pele mais imaculada que já tinha visto. Bom Deus, ela era…
Seus joelhos bateram na areia e ele recebeu outro golpe de água no rosto. Eles haviam chegado à praia e ela o estava arrastando para fora das ondas… e não estava sendo fácil para ela. Ele deveria ajudá-la, mas não conseguia sentir metade do corpo, e a metade que sentia, desejava que não estivesse.
Ergueu as mãos para se apoiar na areia e conseguir levantar, e o toco queimado e em carne viva atingiu a areia. Ele respirou fundo e caiu, mesmo eles estando com água na altura dos joelhos. Ele não tinha mais uma mão. De alguma forma, ele tinha esquecido este detalhe inesquecível, tão distraído quanto estava pelo rosto bonito atrás dele e pelo fato de que cada centímetro do seu corpo doía.
– Você está ferido! – a mulher exclamou com aquela voz melódica. Ele era uma pessoa horrível por estar se sentindo consolado pela aflição dela?
– Só um arranhão, na verdade. – Por que ele queria impressioná-la? Era óbvio que ele estava meio morto. Por que tentar proteger o orgulho? Ela o tirou da água e nadou com ele até a praia.
Seus olhos se arregalaram quando sua suposição anterior, a de antes