James.
– Ele perdeu bastante sangue por causa do ferimento, embora alguém tenha estancado o sangramento logo depois ao queimar a pele, como se não quisessem que ele morresse. Que coisa mais peculiar. – Ele olhou para ela. – Você disse que ele foi deixado para se afogar? Jogado ao mar, talvez?
Ela se encolheu. Aquilo parecia doloroso. Apesar da sua habilidade superior de cura, ela nunca tinha sofrido mais que um corte ou um arranhão aqui e ali. Então não tinha noção do nível de agonia que ele estava experimentando. Queria encontrar as pessoas que tinham feito aquilo com ele e fazê-los sofrer.
– Eu não sei. Talvez ele tenha pulado para escapar. – Ione mal podia discernir o subir e descer do peito dele para se certificar de que ele ainda estava respirando. – Ele é… salvável?
Poseidon fez um som gutural e deu de ombros.
– Talvez. Mas eu gostaria de avaliar este humano antes de dar a ele quaisquer dádivas. – Ele olhou para ela. – Ou deixá-la com ele. Apesar do que você acredita ser o melhor, você nunca viveu entre os humanos.
Com aquilo, ele bateu a base do tridente três vezes na areia e se virou para o oceano. Alguns momentos depois, Tritão apareceu submerso até a cintura, curvando os lábios para o corpo inconsciente de James.
– O que é isso?
– O humano de estimação de Ione – Poseidon disse com a voz entediada. – Venha à terra e avalie-o, por favor.
Com um suspiro dramático, o deus louro trocou as nadadeiras por pés e pisou duro na areia com as pernas humanas, vestindo-se com a armadura mágica de pele de crocodilo, assim como Poseidon. Tritão mantinha o cabelo longo, e a cor era muito parecida com a do dela. Sempre sentiu que as cores dela lembravam mais uma das filhas dele que as de Nereu. As nereidas eram tão vibrantes com os cabelos e as escamas em vários tons de azuis, violetas e tantas outras, enquanto seus dourados e amarelos a faziam parecer desbotada e pálida em comparação. Ela foi provocada incansavelmente sobre isso quando ainda era uma garotinha. Até mesmo suas irmãs, que viviam sem as caldas nas praias das ilhas com poucos ou nenhum habitante, eram mais bonitas.
Ione tinha chegado ao limite de se sentir inferior e sozinha. Ela queria mais. James poderia ser o catalisador da sua nova vida. Ela não tinha que ficar com ele se ele acabasse por ser tão ruim quanto Poseidon temia. Se ele pudesse ajudá-la a começar uma vida como humana, já seria suficiente. Por um tempo.
– O que aconteceu com a mão dele? Tubarão? – Tritão convocou uma enorme concha do nada e a segurou com as duas mãos enquanto ele se abaixava para examinar o ferimento. – Parece recente. Foi uma boa ideia tê-lo cauterizado. Provavelmente salvou a vida dele.
Ione apontou para a água.
– Ele pode ter sido atirado no mar, ou talvez tenha pulado, de um barco não muito longe daquela direção. – Dado o estado dele, ela estava começando a suspeitar que os companheiros do barco estavam tentando assassiná-lo, embora o fato de eles terem-no impedido de sangrar até a morte não fizesse muito sentido. Era para que ele sentisse ainda mais dor? Para ver se ele poderia sobreviver? Perguntaria quando ele estivesse se sentindo melhor e eles estivessem a sós.
Tritão fez que sim.
– Não será muito difícil descobrir o que o povo do mar sabe. Com licença. – Com aquilo, ele desapareceu de volta para o oceano. Às vezes, ela queria ter o poder de desaparecer e reaparecer em outro lugar, assim como os deuses. Tecnicamente, ela era uma semideusa, já que tinha um deus como pai, mas a mãe tinha sido uma ninfa imortal dos oceanos, uma sereia como ela. As filhas de ninfas eram ninfas.
– Você tem certeza de que quer isso? – A pergunta de Poseidon a arrancou de seus pensamentos.
Ione fez que sim.
– Já faz algum tempo que tenho estado descontente.
– Isso não significa que você tenha que se atar ao primeiro humano que acha atraente – ele disse com tom de reprovação. – Se abrir mão da imortalidade, não poderá tê-la de volta.
Ione entendia aquele aviso.
– Ele é agradável aos olhos, mas não é por isso que estou fazendo isso. Ele é uma oportunidade. Uma chance de aprender e ver este mundo. Uma mudança. – Embora, ao olhar para James naquele momento, seus dedos coçassem para afastar o cabelo dos olhos dele. Ansiava provar os lábios dele mais uma vez, dessa vez por prazer e não para salvar a vida dele… não podia evitar se agarrar à esperança de que ele pudesse amá-la apesar da sua cor defeituosa e da empatia que a afastava da sua verdadeira natureza.
– Você não pode passar um dia ou dois na superfície para ver se é isso o que deseja? Se eu fizer o que pede, e você não gostar, estará presa às pernas para sempre. Nada de guelras. Nada de nadadeiras. Nada que a impeça de envelhecer. – Mesmo que o tom dele fosse duro, os olhos eram calorosos.
– Então irei em frente, viverei meus dias mortais ao máximo e minha alma viajará para o Hades enquanto meu corpo volta para o mar. – Nereidas, até aquelas com mães oceânides, eram atraídas para os mares em vez de para a vastidão dos oceanos. Quando elas morriam, os corpos viravam espuma marinha.
– Espero que você saiba o que está fazendo – Poseidon disse enquanto Tritão reaparecia, embora ele não soasse convencido. Ele olhou para o mensageiro. – O que você descobriu?
Tritão apontou para James com a cabeça e atirou uma mão cortada para Poseidon, que a pegou.
– O nome dele é James Harlow, ele é capitão do Misericórdia de Poseidon. Como você pode ver, a mão dele foi removida antes de ele ser atirado na água. – Ele prosseguiu com o tom seco – Cheguei à conclusão de que ele não estava cooperando com as demandas de alguns jovens que queriam tomar seu barco e sua irmã. Ele é um contrabandista de brandy, e de alguns outros bens, mas trata a tripulação com justiça. A não ser pelos peixes para as refeições, ele não desrespeita o oceano ou a vida selvagem, até onde pude descobrir. O povo do mar não disse nada de negativo.
Ione respirou aliviada. Ele não era um vilão, afinal de contas, ainda assim alguém o tinha ferido, e ele não sairia impune. Se ela estivesse em forma humana e mortal, sua magia de ninfa ainda lhe pertenceria. Uma enorme onda bateu com violência na praia, e Tritão e Poseidon se viraram para ela. Ela estremeceu. Quando uma nereida ficava emotiva, o mar costumava responder.
– Peço desculpas. Não gosto de pensar que alguém o feriu.
Tritão lhe deu um sorriso educado e produziu uma pequena rede de um saquinho preso à lateral de sua armadura, então colocou a mão lá dentro. A rede foi tecida com magia e preservaria o que quer que estivesse lá dentro. A expressão contrita mostrava que ele não aprovava, apesar de seus esforços por permanecer imparcial. Depois de ele devolver a rede ao saquinho, ele se aproximou de James e voltou a olhar para ele.
– Nenhum dos meus filhos lhe atraem, criança? – Ele lançou um olhar curioso em sua direção.
Ela sacudiu a cabeça.
– Eu gostaria de que ele estivesse inteiro, no entanto. – Ela ergueu uma sobrancelha e olhou fixamente para Poseidon. Mesmo sem a mão, ela ficaria feliz em ver para onde o destino os levaria, mas o deus podia restaurá-la se ele se sentisse compelido. Por que não tentar?
Antes que Poseidon pudesse dizer uma palavra, um borrão escuro passou por ela e se transformou em um homem de cabelos escuros e vívidos olhos verdes. Ele flutuou acima do solo entre ela e os outros deuses, trajando as vestes peroladas do Olimpo. Asas brancas se agitavam rapidamente aos seus tornozelos.
– Hermes, o que você está fazendo aqui? – Poseidon olhou para o deus mensageiro com desdém. O deus do mar tinha engendrado um sistema no qual o mensageiro de Zeus devia falar com Tritão e não com ele diretamente, porque Hermes lhe dava nos nervos. A última vez que eles se falaram, Poseidon ficou tão irritado que ele desencadeou um maremoto e arrasou com algumas ilhas incautas.
– Eu estava procurando por Tritão, então não tente afogar o mensageiro se você está