Sara Craven

Mais do que uma dúvida


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que Linnet dissera ou fizera conseguira acabar com a sua felicidade nem com os seus sonhos sobre o futuro.

      Isso acontecera inesperadamente, quando Sir Robert anunciara que iria enviar o seu filho para os Estados Unidos para estudar Economia. No início, Alastair opusera-se, mas, no fim, acabara por aceitar os desígnios do seu pai.

      – Não podes convencê-lo? – implorara ela.

      – Não serve de nada, querida – replicara Alastair, com uma expressão dura. – Quando o meu pai mete uma na cabeça, é inútil tentar fazê-lo mudar de ideias. Mas não te preocupes, Chessie, que eu vou voltar. Isto não é o fim da nossa relação, não o vou permitir.

      E ela acreditara nele.

      Para a surpresa de toda a gente, umas semanas depois de Alastair ter ido para os Estados Unidos, Sir Robert anunciara a sua retirada dos negócios e a venda da sua empresa a outra empresa europeia. Imediatamente a seguir, fechara a sua mansão e o casal Markham mudara-se para Espanha.

      Agora, segundo parecia, iam voltar, embora isso não queria dizer necessariamente que Alastair também voltasse. Talvez fossem os sonhos infantis da sua irmã Jenny.

      Chessie não tinha querido fazer perguntas sobre o que ela ouvira nos correios por dois motivos: em primeiro lugar, Jenny não devia ouvir as conversas das outras pessoas. E, em segundo lugar, não queria dar a impressão de estar interessada no regresso daquelas pessoas.

      Estivera apaixonada por Alastair e desta vez ia ter mais cuidado.

      Quase que não se parecia nada com a rapariga de há alguns anos atrás, uma rapariga de cabelo dourado, pele bronzeada e olhos castanhos que sorriam de felicidade.

      «Agora o meu tom é acinzentado», pensou, fitando a blusa. E não era só a sua roupa que era cinzenta, o seu reflexo no vidro da janela mostrava uma mulher cansada e vencida. Uma mulher que tinha sido derrotada durante as semanas entre a prisão do seu pai por fraude e o seu enfarte.

      Sobrevivera aos artigos dos jornalistas, às visitas à esquadra da polícia e à crescente histeria de Jenny… E fizera-o deliberadamente, reprimindo a sua identidade, ocultando-se no anonimato. E, desde aquela altura, tinha sido assim.

      Tinha esperado ser marginalizada, no entanto, salvo algumas excepções, as pessoas da povoação tinham-na tratado com tacto e delicadeza, facilitando-lhe a adopção da sua nova identidade, da sua nova versão da vida.

      Trabalhar para Miles Hunter também a ajudara. E, durante os últimos meses, conseguira inclusive um certo estado de satisfação emocional.

      Mas agora, graças à notícia de Jenny, voltava a sentir inquietação.

      Ia virar-se para voltar para a mesa, quando ouviu o motor de um carro. Esticou o pescoço e viu o veículo de Miles Hunter a virar a prolongada curva do caminho antes de parar diante da porta principal.

      Passado um momento, ele saiu do carro, ficou imóvel durante uns segundos, depois agarrou na sua bengala e, lentamente, coxeou até aos degraus que davam para a porta.

      Enquanto o observava, Chessie mordeu os lábios. Os seus problemas não eram nada comparados com os dele e sentiu uma súbita compaixão que nunca se atrevera a mostrar diante dele.

      – Tinha o mundo aos seus pés – dissera o senhor Jamieson, o advogado da família, quando ela lhe mencionara a oferta de emprego e a possibilidade de permanecer em Silvertrees. – Era jogador de rugby e um jornalista famoso, tanto dos jornais como da televisão. Teve má sorte quando o carro onde ia passou por cima de uma mina, durante a reportagem de uma guerra.

      O advogado abanara a cabeça e acrescentara:

      – Sofreu muitas feridas, pensavam que não voltaria a caminhar. No entanto, surpreendeu toda a gente quando, durante a sua estadia no hospital, escreveu o seu primeiro romance. Um mau dia.

      – E, desde essa altura, não olhou para trás – replicou ela, com ironia.

      O senhor Jamieson fitara-a solenemente por cima da armação das suas lentes.

      – Não, não, querida – declarara, com gentileza. – Acho que pensa muito no passado.

      E Francesca sentira-se censurada.

      Estava novamente sentada à sua mesa, a trabalhar, quando Miles Hunter entrou.

      – Acabo de ver a tua irmã – declarou ele, sem preâmbulos. – Ia de bicicleta e estive quase para a atropelar. A sua bicicleta não tem travões?

      – Sim, claro que tem – replicou Chessie, rapidamente e a resmungar para si mesma. – Mas anda sempre demasiado depressa. Vou falar com ela.

      Miles lançou-lhe um olhar trocista.

      – E isso vai servir para alguma coisa?

      – Pelo menos, vou tentar.

      – Mmmm – Miles fitou-a pensativamente. – Pareceu-me que estava bastante excitada e tu também pareces estar inquieta. Voltou a fazer qualquer coisa que te tenha aborrecido?

      – Jenny não me aborrece – Chessie levantou o queixo ao responder.

      – Não, claro que não – replicou ele, afavelmente, depois suspirou com impaciência. – A quem é que estás a tentar enganar, Francesca? És sempre demasiado condescendente com ela para não ferir os seus sentimentos. Oxalá ela fizesse o mesmo em relação a ti.

      Chessie sentiu-se surpreendida e indignada por Miles estar a tratá-la por tu. Antes, sempre a chamara «menina Lloyd».

      – Foi um dia muito difícil para ela… – começou a dizer Chessie, defensivamente.

      – Mais do que para ti?

      – Sim, de certa maneira sim. Verá, Jenny… – subitamente, Chessie percebeu que estivera para dizer que Jenny era a favorita do seu pai. Aquilo era algo que nunca antes admitira para si mesma. – Jenny era muito nova quando aquilo aconteceu.

      – E não achas que estava na altura de ela assumir as suas responsabilidades? – inquiriu aquele rosto moreno, com uma expressão interrogativa.

      – O senhor é o meu patrão, só isso – replicou Chessie – e não tem o direito de julgar a minha situação. Jenny e eu temos uma relação muito boa.

      – Mas eu e ela não temos uma relação assim tão boa – replicou ele. – Ao dizer-lhe que tivesse cuidado e que visse por onde ia, a tua irmã respondeu-me que não me preocupasse, que brevemente vocês as duas deixarão de me incomodar. O que é que quis dizer com isso?

      Chessie teve vontade de torcer o pescoço de Jenny naquele momento.

      – Deve ter percebido mal. O que Jenny quis dizer é que no Outono vai para a universidade e…

      – Se tiver boas notas nos exames.

      – Isso não é um problema – replicou Chessie, secamente. – É uma rapariga inteligente, não duvido que vá ser bem sucedida nos exames.

      – Esperemos que o teu optimismo seja recompensado. Não posso dizer que tem sido um prazer tê-la aqui em casa.

      Chessie mordeu os lábios.

      – Lamento muito.

      – Tu não tens que te desculpar. Não tens nem a idade nem a experiência necessária para controlar uma adolescente temperamental – Miles fez uma pausa. – Bem, deixemos isso. Vim para te perguntar se queres jantar comigo esta noite.

      Chessie não pôde evitar ficar de boca aberta.

      – Não… não percebo.

      – É muito simples. Pode ser que não o pareça, mas tive um dia maravilhoso hoje. O meu agente vendeu o romance Maelstorm a uma produtora de cinema, a Evening Star Films, e também querem que escreva o guião, o que quer dizer que poderei salvar algo do argumento do meu romance.

      Chessie via-o sorrir com tão pouca frequência que se esquecera do irresistível