Stefano Vignaroli

Crimes Esotéricos


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Você o chamou de Lago Digno. Por que é que em Triora o chamam de Lago Degnu? ‒ perguntei a Luigi.

      ‒ Ah, é a expressão do dialeto. Embora essas terras tenham sido parte do Reino da Sardenha no passado, o fato de as expressões dialetais usarem muito a letra “u” não deriva do sardo. As expressões da Ligúria também são ricas nesta vogal. Por isso, nesta região, o liguriano se mistura ao occitano e quem não é local corre o risco de não entender nada ao nos ouvir falar.

      Eu sorri para ele, pensando que até mesmo no dialeto do interior de Marche a mesma vogal era encontrada com frequência. Paguei a conta e saímos.

      ‒ Bem, eu diria que, neste momento, deveríamos retornar à nossa cara Aurora. Vou tentar distraí-la, fazê-la falar, talvez mantendo a conversa vaga, sem entrar no assunto do crime. Você, discretamente, tente coletar algo útil. Precisamos levar algumas pistas, Mauro, para convencer o Dr. Leone da necessidade de revistar a casa da bruxa de cima a baixo!

      Estacionamos o carro ao lado do Porsche Carrera e caminhamos em direção à entrada da casa Della Rosa. Não havia campainha elétrica, apenas uma corda amarrada a um sininho. Não cheguei a tempo de puxar a corda, porque a porta se abriu e a loira Aurora apareceu com roupas minúsculas, uma regata rosa e uma saia jeans muito curta.

      ‒ Eu senti sua chegada ‒ disse ela. ‒ Entrem, hoje está um dia lindo e claro, e se vocês me seguirem até o terraço, poderão admirar a maravilhosa vista panorâmica do Vale Argentina e das montanhas que marcam a fronteira com a França.

      ‒ Excelente! ‒ eu disse, dando uma piscadela para Mauro. ‒ Sou uma entusiasta das montanhas e adoro belas paisagens!

      Ela nos levou até o terraço, de onde havia de fato uma vista esplêndida.

      ‒ Posso oferecer-lhes um dos meus chás de ervas relaxantes? Eu realmente acho que vocês precisam!

      ‒ Aceitamos o chá, desde que não seja relaxante demais ‒ respondi. ‒ Podemos voltar ao salão para saborear a bebida, Sra. Della Rosa?

      ‒ Claro, acomodem-se. Voltarei em alguns instantes.

      Ela desapareceu na cozinha. Não poderia haver oportunidade melhor, mas teríamos que ser rápidos para não sermos surpreendidos. Enquanto eu dava uma olhada nos livros e na porcelana nas estantes, Mauro se ocupava com maçanetas e objetos, como cinzeiros e bibelôs, para tirar algumas impressões digitais. Minha atenção recaiu sobre um antigo vaso de porcelana azul e branca com uma inscrição em letras góticas que dizia “Red Shepenn”. Levantei a tampa e vi que continha algum tipo de tabaco. Peguei uma pitada e coloquei em um saco plástico transparente.

      ‒ Pode ser droga ‒ sussurrei para Mauro. ‒ Por esse nome, no Oriente, nos tempos antigos, era chamada a papoula do ópio.

      Quando Aurora voltou com três xícaras de chá de ervas fumegante com um forte cheiro de menta, tanto Mauro quanto eu observávamos com curiosidade o conteúdo das estantes. O chá de ervas era muito suave e tinha realmente um efeito relaxante. Depois de terminar de beber sua xícara, a bruxa decidiu acender um de seus cigarros. É estranho dizer, mas o aroma da fumaça do cigarro não me incomodou, na verdade, me atraiu.

      ‒ Você vai ver, Dra. Ruggeri, que um dia desses vai fumar um comigo.

      ‒ Acho que não, nunca fumei em minha vida e não acho que vou começar aos quase quarenta anos. Em vez disso, gostaria de lhe perguntar sobre o significado do pentáculo desenhado nesse piso fabuloso. Estudei simbolismo e símbolos esotéricos, mas aqui vejo alguns com os quais não estou familiarizada. Reconheço o símbolo do espírito, no centro, e as oito linhas que se originam de um ponto e irradiam em direção aos pontos cardeais, os mesmos indicados pela rosa dos ventos.

      ‒ Muito bem, Doutora. Sei que você é bem versada no assunto. Veja, ainda deve pairar por ali o espírito de minha ancestral Artemisia, queimada na fogueira em um certo dia de 1589. O poste ao qual ela estava amarrada parece ter sido cravado no chão naquele exato local. Os outros símbolos indicam o que aconteceu do ponto de vista astral naquele dia. Era o equinócio da primavera, 21 de março, noite de lua cheia e, naquela noite, houve um eclipse total da lua.

      ‒ Sim, começo a interpretar os símbolos. Entretanto, pelo que aprendi, as bruxas de Triora não foram queimadas. Elas foram presas, torturadas, julgadas, condenadas, mas a execução nunca ocorreu, pois o Doge de Gênova se opôs.

      ‒ E esta é a versão oficial, segundo a qual minha ancestral e suas quatro devotadas seguidoras morreram na prisão em Gênova. Mas talvez não tenha sido bem assim. Você é habilidosa e descobrirá a verdade. Não serei eu quem vai lhe contar.

      Ela aproximou o rosto e os olhos do meu rosto e soprou a fumaça na minha face. Baixei o olhar, para não olhá-la diretamente nos olhos, e me vi admirando suas pernas perfeitas, esbeltas, alongadas, sem sombra de celulite. Naquele momento, para minha surpresa, senti um forte desejo sexual por ela. Observei seus lábios se aproximarem dos meus e tive vontade de me unir a ela em um beijo apaixonado. Tentei banir os pensamentos que estavam me perturbando e dei um passo para trás para me afastar dela.

      Bruxa sedutora, pensei comigo mesma. Mas como ela tem esses poderes?

      Nos despedimos dela e voltamos para o carro. O dia estava chegando ao fim da tarde e era hora de voltar para a sede.

      ‒ Tenho a impressão de que perdi alguma coisa. Olhando para o relógio, vejo que passou um pouco mais de tempo do que eu tive percepção! ‒ eu disse a Mauro assim que saímos.

      ‒ Só um pouco? Aquela bruxa encantou você novamente. Ela falou com você em um idioma incompreensível, enquanto você a admirava da cabeça aos pés. A certa altura pensei que vocês iriam se beijar. Mas aproveitei a situação para coletar mais alguns itens, que mostrarei a você mais tarde. A bruxa estava tão concentrada em você e nas palavras que recitava que não prestou atenção em mim. Eu poderia ter desabotoado aquela insípida saia jeans, deixando-a só de calcinha, e ela nem teria notado. Agora você dirige, quero começar imediatamente uma pequena pesquisa no computador de bordo.

      Assim que soltei a embreagem e pisei no pedal do acelerador, o Lamborghini saltou para a frente como um cavalo empinado, preso pelas rédeas por um cavaleiro inexperiente. Mauro, focado na tela do computador, parecia não fazer caso do meu estilo de dirigir, que, depois de alguns instantes, adaptei às características do carro. Percebi que precisava adotar um ritmo moderado, mantendo o pé direito apenas levemente apoiado no pedal do acelerador, para não causar um aumento brusco de velocidade. Depois de alguns minutos de silêncio, em que Mauro estava concentrado no computador e eu nas curvas da maldita estrada, meu colega soltou uma exclamação.

      ‒ Bingo! Encontramos algo. A maioria das impressões digitais que recolhi pertencem à anfitriã da casa. Para fins de comparação, obtive sua impressão digital da xícara em que bebi o chá de ervas. Nas bases de dados não há correspondência entre as impressões digitais de Aurora e as de criminosos registrados. E até aqui, eu diria, nada de novo. No entanto, tenho uma impressão digital no vaso de porcelana que contém tabaco e outra na maçaneta da porta da frente que correspondem a indivíduos registrados. E adivinhe só! A primeira é de Larìs Dracu, a mulher romena cujo rastro foi perdido há vinte anos. Na época, a polícia romena havia prendido a jovem como suspeita de sedição e a fichou. Após a queda do regime comunista, os bancos de dados da polícia secreta também se tornaram acessíveis e, portanto, tive acesso a eles. De qualquer forma, o arquivo foi atualizado mais tarde, pois foi relatado que essa mulher havia fugido do país, descrita como uma criminosa perigosa, até mesmo uma assassina em potencial, e fotos dela foram enviadas a todos os postos de controle de fronteira na Europa. As últimas notícias sobre ela remontam ao verão de 1989, quando conseguiu passar debaixo do nariz de um funcionário da alfândega italiana, no aeroporto internacional de Fiumicino, sob o nome falso de Clarissa Draghi. Com um passaporte italiano falso, ela embarcou em um voo para Katmandu. Depois de alguns dias, o funcionário da alfândega, olhando para a foto fixada à sua frente, notou a forte semelhança com a jovem de vinte anos que havia passado por ali e alertou a polícia nepalesa, que iniciou uma busca. No Nepal, foram localizados os sherpas que guiaram ela e sua companheira de viagem até a fronteira chinesa, nos