Barbara Cartland

O fantasma De Monte Carlo


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conforto, e, quando finalmente chegaram a Nice, só havia duas escolhas: um veículo antigo que só levava onze passageiros e ia diariamente de Nice a Mónaco, ou um vapor, que parecia perigoso e só saía do porto se não houvesse neblina.

      Resolveram ir por terra. Foi um trajeto de horas que pareceram meses, com os outros passageiros comentando o tempo todo sobre bandidos e assaltantes.

      Agora, das janelas da sala, ela via o Cassino e o mar. A oeste estava o porto e, mais além, o grande rochedo de Mônaco, o velho-Palácio e a fortaleza construída há mais de quinhentos anos.

      Emilie estava mais interessada na paisagem atrás do hotel: a vista da cidade, que tinha surgido repentinamente. Uma cidade alegre, cheia de telhados que se elevavam na encosta do morro, casas brancas e brilhantes, mostrando opulência e poder.

      Emilie não tinha acreditado no que os jornais diziam nos últimos anos. Mas, agora, seus olhos não a enganavam, e estava espantada.

      O hotel era mais imponente do que qualquer coisa que havia imaginado. Quando entrou com Mistral e Jeanne, sentiu que os pés afundavam nos tapetes grossos. Havia uma infinidade de palmeiras e flores por toda parte. De repente, Emilie teve medo da própria coragem de entrar naquele mundo.

      Então, algo mais forte a impeliu para a frente. Aproximou-se da receção e começou a desempenhar a pequena peça teatral que já tinha ensaiado.

      —Uma suite foi reservada para mim. Pelo meu administrador, o Sr. Anjou.

      O rececionista fez uma reverência.

      —Sim, senhora. Nós a estávamos esperando. Seja bem-vinda ao Hotel de Paris e a Monte Carlo.

      Emilie inclinou a cabeça, condescendente.

      —Tudo já está preparado, senhora. Se fizer a gentileza de assinar o livro de registro, mandarei que a acompanhem até seus aposentos.

      Emilie pegou a pena de ganso ao lado do livro encadernado em couro, aberto sobre a mesa. Hesitou, observando para ver se o rapaz notava sua hesitação. Virou-se para trás, onde Jeanne segurava a valise com o brasão.

      —É um tanto... difícil— disse, depois de algum tempo—, minha sobrinha e eu viemos passar as férias. Queremos muita calma e queremos... ficar incógnitas.

      —Cuidarei para que seus desejos sejam cumpridos, senhora— o rececionista disse, com ar curioso.

      Ela mergulhou a pena no tinteiro e escreveu, com letras grandes e grossas:

      «Madame...»

      Hesitou novamente, deu um risinho e falou:

      —Madame Secret. Pelo menos durante a minha estada este será meu nome, neste local encantador.

      —Se é isso que deseja— o rececionista fez uma reverência, mas Emilie notou que ele olhava novamente a valise com o brasão.

      —Minha sobrinha será... já sei: mademoiselle Fantasma.

      A suite era deliciosa. Havia um quarto grande para Emilie, um menor para Mistral e uma saleta com terraço, unindo os dois.

      Emilie tinha dado ordens a seu advogado em Paris para reservar o melhor apartamento do hotel. Ele obedeceu, sem dar o nome da cliente, avisando que ela chegaria a Monte Carlo no dia 28 de fevereiro. Emilie não lhe dera nenhuma explicação e não esperava que o hotel fosse tão bom.

      Tinham chegado no fim da tarde e, para desapontamento de Mistral, a tia avisou que jantariam no quarto.

      —Não quero que você seja vista, até abrirmos as malas. Quando aparecermos em público, precisaremos estar bem-vestidas. Assim, as pessoas notarão nossa presença.

      —Mas, tia Emilie, pensei que quisesse ficar incógnita!

      —Não faça perguntas, Mistral. Estou cansada. Amanhã, explico tudo. Agora, boa-noite. Vou dormir cedo e quero ficar sozinha.

      —Claro, titia. Deve estar cansada, depois de uma viagem tão longa. Também estou, mas sinto-me animada também e gostaria de ver Monte Carlo e o Mediterrâneo, antes que escureça.

      Aproximou-se da janela, olhando para o pôr-do-sol avermelhado. Emilie chamou-a, irritada.

      —Vá ajudar Jeanne a abrir as malas, e não fique se mostrando na janela.

      —Sim, tia Emilie.

      Ao ficar sozinha na sala, Emilie foi até à janela e fez o que tinha proibido a Mistral: olhou o pôr-do-sol, procurando enxergar a cidade. Também estava impaciente. A noite devia passar depressa.

      Depois do jantar, colocou a valise com brasão sobre uma poltrona perto da cama e olhou-a.

      Era uma valise muito bonita. Sem perceber o que fazia, acariciou o couro; depois, tirou uma chave da bolsa e abriu.

      Estava cheia de cadernos do tipo usado pelas jovens para escreverem seus diários.

      Lentamente, e com uma ternura muito especial, Emilie pegou um dos cadernos. Era uma espécie de álbum de recortes de jornal. Havia seis na página em que abriu, todos com data de dezoito anos atrás, referindo-se a um lugar e a uma pessoa.

      As autoridades de Monte Carlo ficariam interessadas, se vissem os cadernos, pois se constituíam uma espécie de história do nascimento da cidade.

      No começo, os recortes se referiam a acontecimentos espaçados, com intervalos de até dois ou três meses. Depois, se referiam apenas ao Grão-Duque Ivã da Rússia. Tornavam-se mais numerosos, à medida que os anos passavam. Descreviam a construção do Cassino de Monte Carlo, as belezas da região, as festas, os bailes de gala. E havia colunas escritas por correspondentes, mencionando os frequentadores daquele ambiente luxuoso.

      Príncipes: da Rússia, de Montenegro, da Sérvia e da Bulgária. Rajás, Marajás, Duques, Arquiduques e milionários sem nobreza. Todos recebiam comentários. Havia recortes anunciando quando o Príncipe, e a Princesa de Gales haviam visitado o local.

      Apesar de tantos nomes ilustres, apenas um aparecia sublinhado em tinta azul. Surgia sempre na abertura da temporada de ópera e nas inaugurações. Sempre o mesmo nome, sempre sublinhado em azul: Sua Majestade Imperial, o Grão-Duque Ivã da Rússia.

      Nos últimos anos, havia outro nome sublinhado, sempre junto com o primeiro: Sua Alteza Sereníssima, o Príncipe Nicolai, filho do Grão-Duque.

      Lentamente, Emilie foi virando as páginas. Alguns cadernos estavam gastos, como se já tivessem sido folheados muitas vezes.

      Agora, sentada ali no Hotel de Paris, ela lembrava que tinha esperado dezoito anos por aquele momento.

      Passava da meia-noite, quando colocou os cadernos na valise. Mas não estava cansada, como qualquer outra mulher estaria em sua situação, depois daquela viagem longa; Em vez disso, sentia-se incrivelmente forte.

      Nada nem ninguém poderia impedi-la de fazer o que tinha planejado.

      Ao pensar no que a esperava, fechou os olhos e sorriu. Parecia diabólica, naquele momento; depois de um segundo, seus pensamentos voltaram ao passado e a expressão se suavizou, como sempre acontecia quando pensava em Alice. Alice, a única pessoa que havia amado em toda sua vida.

      Como essa noite era diferente da primeira noite que tinha passado em Monte Carlo, na viagem com Alice!

      Haviam chegado exaustas e foram recebidas pelos gritos de alegria da tia e dos primos com os quais iam se hospedar. Emilie não os conhecia. Mas eram primos em primeiro grau de sua mãe e tinham dado uma resposta sincera e calorosa, quando lhes escreveu que queria visitá-los.

      Emilie quase esperara uma recusa educada, apesar de Marie ter dito que Louise era sua irmã preferida. Tia Louise lhe deu um abraço apertado e os seis primos e quatro primas adoraram a visita.

      Desde criança, Emilie sabia que era filha ilegítima e tinha consciência da agressiva barreira entre ela e a família da mãe. Mas, em relação aos primos, não precisava ter se preocupado.

      Os