é uma situação policial muito delicada. Apenas fique de boca fechada e me diga o que você encontrar.
Ramirez espantou-se quando eles caminharam até o iate.
- É uma embarcação e tanto – ele disse. – Parece um Sea Ray 58 Sedan Bridge. Dois andares. Sombra em cima, ar condicionado dentro.
Avery impressionou-se.
- Como você sabe tudo isso? – Perguntou.
- Gosto de pescar – ele respondeu. – Nunca pesquei em algo assim antes, mas podemos sonhar, certo? Eu deveria te levar para conhecer meu barco qualquer hora.
Avery nunca gostou muito do mar. Praia, às vezes. Lagos, com certeza. Mas embarcações a motor e mar aberto? Davam ataques de pânico. Ela havia nascido e crescido em terra firme, e a ideia de estar balançando nas ondas, sem ideia do que poderia estar à espreita no fundo das águas, fazia sua mente ter pensamentos terríveis.
Holt e seus dois detetives ignoraram Avery e Ramirez quando eles passaram e se prepararam para entrar no barco. Um fotógrafo na proa fez um último clique e acenou para Holt. Ele caminhou até a embarcação a estibordo e levantou suas sobrancelhas para Avery.
- Você nunca mais vai olhar para um iate do mesmo jeito – brincou.
Uma escada portátil branca levava ao barco. Avery subiu, colocou suas mãos nas janelas pretas e foi em direção à parte frontal.
Uma mulher de meia idade e aparência santa com cabelo vermelho selvagem havia sido posicionada na parte frontal da embarcação, ao lado das luzes laterais da proa. Ela estava deitada, virada para o leste, com suas mãos presas aos joelhos e cabeça baixa. Se ela estivesse sentada, poderia parecer adormecida. Estava completamente nua, e o único ferimento visível era uma linha escura em volta do pescoço. Ele quebrou, Avery pensou.
O que fazia a vítima destacar-se, além da nudez e da apresentação pública de sua morte, era sua sombra. O sol estava no leste. Seu corpo estava ligeiramente posicionado para cima, e isso produzia uma imagem de espelho dela que formava uma sombra longa e deformada.
- Caralho! – Ramirez suspirou.
Como fazia quando limpava sua casa, Avery abaixou-se e olhou para a proa. A sombra poderia ser uma coincidência ou um sinal com algum sentido deixado pelo assassino, e se ele tivesse deixado um sinal, poderia ter deixado outro. Ela seguiu para o outro lado.
No brilho do sol, na superfície branca da proa, logo acima da cabeça da mulher, entre o corpo e a sombra, Avery viu uma estrela. Alguém havia usado os dedos para desenhar um estrela, com saliva ou água do mar.
Ramirez chamou O’Malley.
- O que os peritos dizem?
- Encontraram alguns pelos no corpo. Podem ser de carpete. A outra equipe ainda está no apartamento.
- Que apartamento?
- O apartamento dela – O’Malley respondeu. – Acreditamos que ela foi raptada lá. Não há digitais em nenhum lugar. O cara devia estar usando luvas. Como ele trouxe ela para cá, em uma doca muito visível, sem ninguém ver, não sabemos. Ele escureceu algumas das câmeras da marina. Deve ter feito isso antes do crime. Ela foi morta possivelmente ontem à noite. O corpo não parece molestado, mas o coronel tem que dar a última palavra.
Holt riu.
- Isso é perda de tempo – ele disse a O’Malley. – O que essa mulher poderia encontrar que meus homens já não teriam descoberto? Eu não estou nem aí para o último caso dela ou sua imagem pública. Até onde eu sei ela é só uma advogada acabada que deu sorte em seu primeiro caso importante porque um assassino em série, que ela defendeu no tribunal, a ajudou!
Avery levantou-se, inclinou-se sobre a grade e olhou para Holt, O’Malley e os outros dois detetives na doca. O vento batia em sua jaqueta e suas calças.
- Vocês viram a estrela? – Ela perguntou.
- Que estrela? – Holt respondeu.
- O corpo dela está virado de lado e para cima. Na luz do sol, isso cria a sombra de uma imagem com a forma dela. Muito raro. Parece quase como se fossem duas pessoas, de costas uma para a outra. Entre o corpo e a sombra, alguém desenhou uma estrela. Pode ser uma coincidência, mas o local é perfeito. Talvez podemos ter sorte se o assassino desenhou com saliva.
Holt virou-se para um de seus homens.
- Você viu uma estrela?
- Não, senhor. – Respondeu um homem magro, loiro e de olhos castanhos.
- E os peritos?
O detetive balançou a cabeça.
- Ridículo. – Holt murmurou. – Uma estrela desenhada? Uma criança poderia ter feito isso. Uma sombra? Sombras são feitas pela luz. Não tem nada de especial nisso, Detetive Black.
- Quem é o dono do iate? – Avery perguntou.
- Essa informação não nos ajuda. – O’Malley respondeu. – É um grande empresário do ramo imobiliário. Está no Brasil a negócios há pelo menos um mês.
- Se o barco foi limpo no último mês - Avery disse, - então a estrela foi colocada aqui pelo assassino. E já que está localizada perfeitamente entre o corpo e a sombra, tem que ter algum significado. Não tenho certeza do que, mas é algo.
O’Malley olhou para Holt.
Holt suspirou.
- Simms - ele falou para o agente loiro, - traga os peritos de volta. Investiguem a estrela e a sombra. Eu vou telefonar quando nós terminarmos.
Holt lançou um olhar miserável para Avery e balançou sua cabeça.
- Vamos ver o apartamento dela.
CAPÍTULO TRÊS
Avery caminhou vagarosamente pelo hall do prédio escuro, com Ramirez a seu lado e seu coração batendo mais forte, como sempre acontecia quando ela entrava na cena de um crime. Nesse momento, ela desejava estar em qualquer lugar que não fosse ali.
Ela fugiu daquela sensação. Fez sua expressão de trabalho e forçou-se a observar cada detalhe.
A porta do apartamento da vítima estava aberta. Um agente parado do lado de fora moveu-se para permitir que Avery e os outros entrassem na cena do crime.
Um corredor estreito levava à sala. A cozinha ficava ao lado do corredor. Nada parecia fora do comum ali; apenas um apartamento muito bacana. As paredes eram pintadas de cinza claro. Havia estantes de livros por todos os lados. Pilhas de livros estavam no chão. Plantas penduradas nas janelas. Um sofá verde de frente para uma televisão. No único quarto, a cama estava feita, com um edredom branco de renda.
O único fator obviamente estranho no apartamento estava na sala, onde claramente faltava um tapete central. Um contorno de poeira, em um espaço escuro, havia sido marcado com várias etiquetas amarelas de polícia.
- O que os peritos encontraram aqui? – Avery perguntou.
- Nada - disse O’Malley. – Nenhuma digital. Nenhuma câmera. Estamos no escuro.
- Algo foi tirado do apartamento?
- Não que eu saiba. O pote de moedas está cheio, as roupas estão arrumadas no cesto. Dinheiro e documentos ainda nos bolsos.
Avery começou a analisar o apartamento.
Como fazia habitualmente, moveu-se em pequenas seções e observou cada uma delas com cuidado—as paredes, o piso, os rodapés de madeira, as bugigangas nas prateleiras. Havia uma foto da vítima com duas amigas. Ela fez uma nota mental para lembrar-se de descobrir os nomes e o contato delas. As estantes e pilhas de livros foram analisadas. Havia muitos romances. O restante era, em sua maioria, sobre assuntos espirituais, como autoajuda e religião.
Religião, Avery pensou.
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