preciso fazer reserva. Dá para fazer pela internet.
— Como você disse, — afirmei, sorrindo — muito organizados. E isso?
— Essa é a área de esportes aquáticos. Dá para alugar caiaques, fazer esqui aquático, mergulho e muitas outras coisas. Você gosta desse tipo de atividade?
— Sim, adoro. E você?
— Não experimentei muito, mas poderíamos tentar juntos.
— Com certeza! Já está na minha lista desde que soube que viria para cá.
— Agora estamos chegando à área para ficar na areia. É muito normal que as pessoas construam castelos. Olha!
Paramos um pouco para ver um grupo de jovens terminando de construir um tempo de areia de um tamanho descomunal. Devia ter quase dois metros de altura e quatro de largura. Nenhum de nós reconhecemos o edifício, mas Sumalee me disse que o estilo era muito parecido com os templos de Angkor, em Camboja. Havia muitas pessoas tirando fotos. Sumalee me contou que outra atividade típica do parque era a fotografia. Outra coisa que abundava era gente correndo. Era como o Parque do Retiro, em Madri, mas tinha quase o dobro do tamanho, com mar e mais possibilidades. A coincidência era que tinha tudo muito bem dividido e com cada coisa em seu lugar. Era muito artificial também. Voltamos a pegar as bicicletas e continuamos a andar. Passamos por um edifício com o logotipo do Burger King. Isso me fez esboçar um sorriso irônico. Por mais longe que acreditamos ter ido de nosso ambiente, descobrimos que a suposta “civilização” já tinha chegado antes.
— Sumalee, e isso aqui? É um camping?
— Sim, há algumas áreas habilitadas para acampamento. Também dá para reservá-las pela internet — ela disse, rindo.
— Não duvidada — afirmei, enquanto pensava quanto eu gostava do som da sua risada.
Pedalamos durante algumas horas, percorrendo os quinze quilômetros de costa e parando de vez em quando para comentar algo, descansar ou parando em algum quiosque para beber alguma coisa. Em um deles vendiam ostras por um dólar, então comemos um par cada um. Para beber, aconselhado por Sumalee, pedi duas cervejas Tiger, que tinha um tigre como logotipo e era típica dali, de cor dourada pálida. Era bem suave e eu gostei. Como não podia ser diferente, brindamos por muitos dias como esse.
Vimos gente pescando com varas nas docas, famílias, casais de namorados, amigos em churrasqueiras, extensas praias de areia de uma largura que ia de dez metros a até apenas um com palmeiras e outros tipos de árvores ao fundo. A areia, no entanto, não era grande coisa, pois havia muitas garrafas de plástico jogadas pelo chão e o mar estava sempre cheio de grandes cargueiros. Também havia uma pista de patinação com obstáculos, áreas com aparatos para fazer ginástica, campos de vôlei, bancos com teto para descansar, caminhos estreitos de grandes pedras planas onde só dava para ir andando, além de muitos mapas para se orientar pelo caminho. As possibilidades eram incríveis, mas a manutenção e a limpeza não eram tanto como se esperava. Sumalee me disse que antes era melhor ainda e que nos últimos tempos havia decaído um pouco. Achei muito engraçado uma placa que proibia apontar com ponteiros laser para os aviões. Os aviões passavam muito próximo à terra porque o aeroporto de Changi não ficava longe dali. Outra queixa que se podia fazer ao lugar era o excesso de gente em quase todos os lugares, mas era preciso se levar em conta que era domingo, dia de suposta presença máxima de público. Teoricamente, nos outros dias o parque era mais tranquilo.
Quando nos cansamos de dar voltas, paramos em uma área de praia onde não havia ninguém. Já era tarde e as pessoas estavam indo para suas casas. No dia seguinte era segunda, dia de trabalho. Ficamos descalços e nos aproximamos da orla. Paramos bem rente ao mar, onde a água das ondas acariciava nossos pés de vez em quando.
— A água desta área costuma ser suja, não é muito aconselhável se banhar, apesar de termos visto algumas pessoas fazendo isso — disse Sumalee. — Em todo caso, não é permitido se afastar muito da orla a nado.
— Suja? Tem algo sujo em Cingapura? Isso, sim, é novidade. Se bem que essas praias também precisam de uma limpeza.
— Não é mesmo? É por causa de todos esses barcos que vemos aí. Ainda assim, às vezes venho aqui, me sento e me perco observando o azul do mar. Sei que do outro lado fica minha terra, minha casa, minha mãe.
Olhei para Sumalee. Por um momento, ela tinha ficado melancólica e parecia estar prestes a chorar. Passei um braço em torno de seus ombros e a aproximei com suavidade de mim.
— Deve ser difícil ficar tanto tempo longe dela e, ainda por cima, sabendo que ela precisa de você. Pense que tudo isso é por ela e que, quando tiver pago sua dívida, vocês poderão ficar juntas para sempre e será você quem a terá salvado.
— Sim, quando tiver pago minha dívida — disse, dando um suspiro. Mesmo que isso signifique tomar decisões que nem sempre gosto.
— Que decisões?
— Ah! Nada, nada. Coisas minhas.
Ficamos abraçados por um tempo, sem dizer nada. Na parte mais distante do mar dava para ver alguns catamarãs e uns caiaques amarelos dos que se podia alugar no parque. Mais longe se viam dezenas de cargueiros, todos grandes ou enormes. Acho que, se algum deles esvaziasse seus desperdícios na água ou se tivesse alguma perda de combustível, seria o suficiente para deixar as águas em um péssimo estado, por mais cuidados que fossem empregados e por mais que tentassem limpar.
A luz solar começava a cair de forma evidente. Estava começando a anoitecer. De acordo com o horário do parque, só havia iluminação ali das sete da manhã às sete da noite. Logo estaríamos no escuro e tínhamos que voltar porque não queríamos ter que refazer o caminho andando com bicicletas sem iluminação.
Sumalee se aproximou um pouco mais de mim e percebi que sua cabeça roçava meu corpo. Em imbuí de coragem e procurei sua mão com a minha. Não demorei para encontrá-la e a apertei com força. Ela me correspondeu. Tanto fazia a praia suja, a água insalubre ou tantos barcos estragando a paisagem. O céu alaranjado, o silêncio ao nosso redor perturbado apenas pelo canto de algum pássaro e sua mão segura na minha, era o paraíso.
Voltei para ela, nervoso, e com minha outra mão a segurei com suavidade pelo queixo e ergui um pouco sua cabeça de forma que nos olhássemos nos olhos a poucos centímetros um do outro. Ela olhava séria para mim, com intensidade, expectante. Abaixei minha cabeça e pousei meus lábios sobre os seus. Ela os entreabriu um pouco e eu peguei seu lábio inferior entre os meus. Passei assim um segundo, saboreando-o e, então, me afastei, devagar, deixando-o escapar de forma lenta. Por um momento achei que Sumalee ia se lançar sobre mim e me dar outro beijo, mas de repente sua expressão mudou.
— Temos… temos que ir — ela disse, com a voz trêmula.
— Acho que sim, mas não porque eu queira sair daqui. Estenderia este momento para sempre.
Sumalee não respondeu. Virou-se e puxou minha mão para que eu a seguisse. Montamos nas bicicletas e voltamos para a entrada o mais rápido que pudemos. Ainda assim, os últimos minutos percorremos quase às escuras.
Devolvemos as bicicletas e fomos andando até o ponto de ônibus de mãos dadas, sem dizer nada. Tínhamos que pegar ônibus diferentes. O primeiro a chegar foi o dela. Quando chegou ao ponto, me deu um beijo muito suave na bochecha, fez uma carícia no rosto com um olhar que dizia “não fique triste” e entrou. No meio das escadas, virou-se e me disse:
— Vamos no falando. Se cuida.
— Você também, Sumalee. Tudo bem?
Ela se virou sem responder e procurou um assento. Vi seu ônibus se afastar com uma estranha sensação. Uma mistura de euforia pelo beijo que tínhamos dado e de confusão por sua atitude depois. Não sabia muito bem o que significava. Ela não recusou o beijo, até o devolveu; mas algo a deteve logo. Ela não olhou mais para mim e tinha ficado pensativa; quase aflita, eu diria. Ainda assim, tinha falado em nos falarmos de novo. Como interpretar isso? Talvez não