novos, mas sentia-os estranhos na boca. Embora já lhe tivessem tirado os pontos e tivesse baixado o inchaço, custava-lhe vocalizar.
– Deixo-vos sozinhos – disse Pauline. – Queres que te traga um café, Will?
– Não, estou bem, obrigado.
A sua mãe saiu, deixando-os sozinhos no grande quarto privado, reservado para pacientes VIP. Pelos vistos, ela era VIP porque a sua família tinha feito um donativo chorudo uns anos antes.
– Como estás hoje, Cynthia?
– Bastante bem, obrigado. Como estás tu?
– Estou bem – Will franziu a testa um momento. – Ocupado, como sempre.
– Pareces cansado – disse ela. Não sabia que aspeto tinha normalmente, mas estava com olheiras. – Dormes bem?
– Nem por isso – admitiu ele após uma breve pausa. – Tem sido num mês muito stressante.
– Precisavas de um bocadinho disto – disse ela, tocando no fio da via intravenosa. – Dormes dezasseis horas como um bebé, quer queiras quer não.
Ficou contente por ver que Will sorria. Era a primeira vez que via o seu sorriso desde que saíra do hospital. Desejou ouvi-lo a rir. Ele irradiava segurança e sexualidade; não duvidava que o seu riso devia ser muito sexy.
– Aposto que sim – disse ele, incomodado.
Ela nunca sabia o que dizer-lhe. Recebia visitas constantes de amigos e parentes, aos que juraria nunca ter visto na vida, mas nenhumas eram tão incómodas como as de Will. Quanto mais amável era, mais distante ele ficava, quase como se não esperasse que ela o tratasse bem.
– Tenho uma coisa para ti.
– A sério? – ela endireitou-se um pouco mais.
No início, tinham-lhe inundado o quarto de presentes. E continuavam a chegar ramos de flores da família e mesmo de desconhecidos que tinham lido a sua história nas notícias. Ser uma das três sobreviventes de um acidente de avião era digno de muitas manchetes.
– A companhia aérea ligou-me. Continuam a classificar os restos do avião e encontraram isto. A inscrição a laser do número de série do diamante levou-os a mim – tirou uma caixinha de veludo do bolso. Abriu-a e revelou um enorme anel de diamantes.
– É muito bonito.
Pela cara de Will, não era a resposta certa.
– É o teu anel de noivado.
Ela esteve prestes a desmanchar-se a rir, mas ao ver a sua expressão séria, conteve-se.
– O meu? – parecia-lhe absolutamente descabido ser dona de um anel como aquele. Observou Will a colocar-lhe o anel no dedo, na mão esquerda. Estava-lhe um pouco justo, mas tinha os dedos inchados por causa do braço partido. Olhou para o anel e sentiu uma familiaridade vaga. – A verdade é que sim, parece-me tê-lo visto antes – os médicos tinham pedido que comentasse tudo o que parecesse trazer-lhe alguma recordação.
– Isso é bom. É bom, se te é familiar é porque já o viste antes. Mandei-o limpar e analisar, mas queria trazer-te. Não é de estranhar que o perdesses no acidente. Tanto fazer dieta para o casamento, estava-te solto.
– E agora está-me demasiado apertado e pareço a derrotada de um combate de boxe – disse ela com uma careta que lhe provocou uma pontada de dor na bochecha.
– Não te preocupes, há tempo de sobra. Estamos em outubro. Em maio já deves estar recuperada.
– Em maio no Plaza – disse ela, sem saber por que se lembrava daquilo em concreto.
– Pouco a pouco deve ir voltando tudo – disse ele com um sorriso que os seus olhos não refletiam. Levantou-se e guardou a caixa no bolso. – Hoje à noite vou jantar com o Alex, de modo que será melhor ir-me embora.
Ela lembrava-se da visita de Alex na semana anterior. Era amigo de Will desde a escola, e um sedutor. Mesmo com o seu aspeto, tinha-lhe dito que era uma beldade e que, caso não estivessem noivos, a roubaria a Will. Mesmo que fosse mentira, ela agradecera o esforço.
– Divirtam-se. Acho que aqui devemos jantar frango de borracha com arroz.
Will riu-se suavemente e acariciou-lhe a mão.
– Vejo-te amanhã – disse.
Assim que a tocou, ela sentiu um arrepio familiar nas costas. Em vez de sentir dor, cada terminação nervosa do seu corpo reagiu com interesse. Involuntariamente, apertou-lhe a mão para prolongar a ligação que almejava.
O contacto com ele era melhor do que a morfina. O simples roçar dos dedos dele na pele fazia-a sentir-se viva e excitada. Era assim desde a primeira vez que ele lhe beijara o dorso da mão. Ainda que o seu cérebro não reconhecesse a imagem, o seu corpo reconhecia o seu amante.
Will olhou para a sua mão e depois para ela com uma curiosidade que a fez perguntar-se se ele sentia a mesma ligação. Então, percebeu que os seus olhos eram azul-acinzentado. Por um momento pareceram suaves e recetivos, como se a sua indiferença se dissolvesse, mas nesse preciso momento o som do seu telefone distraiu-o e afastou-se.
– Boa noite, Cynthia – disse, dirigindo-se à porta.
Assim que ele saiu, o quarto voltou a ficar frio e estéril como qualquer outro quarto de hospital, e ela sentiu-se mais sozinha do que nunca.
Alex saboreava a sua bebida do outro lado da mesa. Estivera em silêncio durante os dois primeiros pratos. Will apreciava a sua capacidade de estar em silêncio, sem forçar assuntos nem fazer conversa fiada. Sabia que o seu amigo entendia que tinha muitas coisas na cabeça e precisava de desfrutar do seu uísque escocês antes de poder falar.
Convidara Alex para jantar porque precisava de falar com alguém sincero. A maior parte das pessoas diziam-lhe o que queria ouvir. Mas Alex era uma das poucas pessoas que conhecia que tinha mais dinheiro do que ele, e não tinha papas na língua. Era um reconhecido playboy e Will não costumava pedir-lhe conselhos de tipo romântico, mas sabia que Alex iria dar-lhe a sua opinião clara com respeito a Cynthia.
A relação entre eles era um desastre. Umas semanas antes achara que não podia piorar, mas fora tentar ao diabo.
– Como está a Cynthia? – perguntou Alex finalmente.
– Melhor. Está a recuperar-se muito bem, mas continua sem se lembrar de nada.
– Incluindo a discussão?
– Sobretudo da discussão – Will suspirou.
Antes de Cynthia ter ido para Chicago, Will tinha-a confrontado com provas da sua infidelidade e tinha acabado o compromisso. Ela tinha-lhe dito que podiam falar e resolver aquilo quando voltasse, mas para ele já tinham acabado. O avião de Cynthia sofrera um acidente do qual ela, milagrosamente, escapara, mas tinha acordado com amnésia. Will achara cruel deixá-la sozinha e decidira esperar que se recuperasse e ir-se embora depois.
Aquela fora a ideia original. Mas a situação estava a complicar-se. Por isso tinha chamado Alex, para que o ajudasse a pôr as ideias no lugar.
– Já lhe disseste?
– Não. Hei de falar com ela quando lhe derem alta. Quase nunca estamos sozinhos no hospital, e não quero envolver os pais dela.
– Nunca mais voltou a ser a víbora frígida que todos conhecemos e amamos? – ironizou Alex.
Will abanou a cabeça. Uma parte dele desejava que o fosse. Então, poderia deixá-la sem se sentir culpado. Mas desde o acidente, parecia uma mulher diferente. Estava a custar-lhe adaptar-se às mudanças que via nela, e continuava à espera que começasse a ladrar ordens ou a criticar o pessoal do hospital. Mas nunca o fazia. Embora contrariado, devia admitir que cada vez desfrutava mais nas suas visitas.
– É como se tivesse sido raptada por extraterrestres e substituída por outra.
–