Andrea Laurence

Memórias ocultas - Perseguindo os sonhos


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de cima a baixo. Deixou fugir um gemido e afastou os dedos.

      – É uma maravilha – murmurou. – Obrigada.

      Ele assentiu e deu um passo atrás, sem parar de olhar para ela. Ela desejou poder compreender o que significava o seu olhar intenso, não sabia se desejo, irritação ou curiosidade.

      – Estás com fome?

      – Estou – admitiu. Pelos vistos, tinha confundido um olhar de fome com um de luxúria.

      – Está bem – sorriu ele. – Posso ir buscar qualquer coisa. Há um restaurante tailandês aqui perto.

      Will assentiu e saiu do quarto. Pouco depois, ouviu-se a porta a fechar-se.

      Ela desenredou o cabelo e foi ao armário em busca de qualquer coisa confortável. Na parte de trás havia roupa de um tamanho maior. Estava a olhar para uns leggins quando o telefone tocou.

      Pensando que seria Will, foi até ao quarto atender.

      – Estou?

      – Cynthia? – sussurrou a voz de homem, mais grave do que a de Will.

      – Sim, sou a Cynthia. Quem fala?

      – Amor, sou o Nigel.

      Nigel, o nome não lhe dizia nada, mas tinha-a chamado «amor» e não gostava nada disso.

      – Desculpe. Não me lembro de si... Tive um acidente e diagnosticaram-me amnésia.

      – Amnésia? Meu Deus, Cynthia! Tenho que ver-te. Estou há semanas a morrer de preocupação. O teu telemóvel está desligado... Não pude ir ver-te ao hospital. Só sei o que li nos jornais, e não é muito. Podemos ver-nos amanhã, quando o Will estiver no trabalho?

      Cynthia ficou com um nó no estômago. Parecia óbvio que Nigel era o seu amante. Lembrou-se do que Will lhe tinha dito: «Podes sempre escolher».

      O passado era o passado. Will tinha-lhe oferecido um novo começo, uma folha em branco e, talvez, um futuro juntos. Estava disposta a tentar. Queria ficar com Will. O homem que estava ao telefone podia arruinar tudo.

      – Não, lamento.

      – Amor, espera. Eu apanho o primeiro comboio do Bronx e bebemos um café juntos.

      – Não. Por favor, não volte a ligar. Adeus – desligou o telefone. Segundos depois, voltou a tocar e viu no ecrã que era o mesmo número. Não atendeu.

      Respirou fundo e voltou para o armário para se vestir para o seu primeiro jantar com Will.

      Will olhava, sem ver, para o ecrã do seu computador portátil. Depois de jantar tinha ido para o seu escritório para trabalhar um pouco, como costumava fazer. Um jornal não se fechava sozinho e, visto que passava grande parte do dia em reuniões pouco produtivas, mas necessárias, era a única hora em que podia rever o correio eletrónico e trabalhar a sério. Naqueles últimos anos, o escritório e o trabalho tinham-se transformado no seu refúgio de uma relação frustrada.

      No entanto, naquela noite não conseguia concentrar-se no trabalho. Não parava de pensar em Cynthia.

      Tinha-a observado a percorrer o apartamento através das portas envidraçadas que separavam o seu escritório da sala. Tinha ido comprar o jantar pensando que as coisas estavam a correr bem entre eles. Mais do que bem, se tivesse em conta que ver a sua pele húmida depois do duche lhe tinha provocado uma potente e imediata reação física. Felizmente, o passeio até ao restaurante tinha feito a função de duche frio, e quando voltou a casa estava tudo sob controlo.

      Tinham jantado na casa de jantar, a conversar sobre coisas várias, mas tinha-a notado nervosa. Quando o telefone tocara, tinha-se levantado de um salto, como a sua vida dependesse disso. Era Pauline, e mãe e filha tinham conversado um pouco enquanto ele levantava a mesa e ia enclausurar-se no seu escritório.

      Will perguntava-se se teria percebido a sua atração por ela e isso a deixava desconfortável. Tinha mencionado a possibilidade de um futuro juntos, embora não lhe convencesse muito a ideia. Mas o seu cérebro e o seu corpo pareciam estar a seguir caminhos diferentes.

      Não ficou surpreendido por ela se ter ido deitar cedo. Era o seu primeiro dia fora do hospital e era lógico que estivesse estafada. Além do desafio físico, tinha recebido muita informação sobre o seu passado, que era sempre difícil de processar.

      Visto que parecia nervosa na sua presença, decidiu ir dormir para o quarto de hóspedes.

      Will desligou o computador à meia-noite. Acordava às seis, mas estava habituado a dormir pouco. Haveria de dormir quando se reformasse.

      Já estava vestido e a beber o seu café quando Cynthia entrou na cozinha na manhã seguinte. Tinha um pijama de seda azul escuro sob o robe e o cabelo apanhado num rabo de cavalo. Ainda tinha olhos ensonados e marcas dos lençóis no rosto. A mulher que conhecia não teria permitido que ninguém a visse assim, nem sequer ele. Saía sempre do quarto penteada e maquilhada. Will disfarçou a sua surpresa dando um gole no café. Custava-lhe habituar-se à nova Cynthia.

      – Bom dia – disse ela, esfregando os olhos.

      – Bom dia – respondeu ele, levantando-se para encher a sua caneca. – Queres café?

      – Não, obrigada – franziu o nariz. – Experimentei no hospital e não gostei.

      Will voltou para a mesa e empurrou-lhe um prato com duas torradas de pão integral.

      – No armário há chá e chocolate em pó, se preferires.

      Cynthia sentou-se e tirou uma torrada do prato. Parecia mais descontraída do que na noite anterior. Will, aliviado, pensou que passar algum tempo sozinha em casa talvez a ajudasse a adaptar-se.

      – Odeio ter de me ir embora agora que acabaste de acordar, mas estou cheio de trabalho. Vou tentar não ficar até muito tarde.

      – Trabalhas muito – comentou ela.

      – Faço o que tenho que fazer – Will encolheu os ombros, levantou-se e deixou a caneca no lava-loiça. – A empregada deve vir sobre o meio dia, de modo que não vais estar sozinha. Ela vai fazer o jantar para não termos que sair. Acho que hoje é dia de estufado.

      – Está bem – assentiu ela, franzindo a testa.

      – O que foi?

      – Acho estranho que alguém venha cozinhar e limpar para mim. Não sei porquê, mas é estranho.

      – Tenho a certeza que vais habituar-te ao luxo rapidamente, especialmente quando provares as beringelas à parmesã da Anita. É uma artista na cozinha. Se precisares de alguma coisa, liga-me para o telemóvel – vestiu o casaco. – Pus uma lista de números telefones no frigorífico, incluídos os da tua família e amigos.

      – Obrigada – disse ela, levantando-se para o acompanhar à porta.

      – Até logo à noite – inclinou-se para dar-lhe um beijo de despedida, mas viu que ficava com os olhos esbugalhados e ficava tensa. Lembrando a sua reação ao beijo do dia anterior, pensou que era má ideia, de modo que parou, fez um gesto com a mão e saiu para o vestíbulo.

      Enquanto descia no elevador, Will abanou a cabeça. Ela estava a absorvê-lo como areias movediças. Quanto mais tentasse lutar, mais se afundaria.

      Cynthia ficou a olhar para a porta, mais confusa do que nunca. Tinha ficado com o coração acelerado quando pensou que ia beijá-la. O beijo da noite anterior tivera o efeito de lhe fazer querer mais. Sabia que era demasiado cedo para um romance e que os beijos só iam complicar mais as coisas. Mas não podia deixar de fantasiar com como seriam esses beijos. Bastava-lhe cheirar a sua colónia de especiarias para ficar com o pulso acelerado. Por sorte, já não estava ligada a monitores que pudessem delatar a atração que sentia por ele.

      Abanou a cabeça e voltou para o quarto para se vestir. Optou por umas calças caqui, uma blusa