Elizabeth Spann Craig

Empréstimo Mortal


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está você! – disse ela, com a voz rouca de fumante, me fazendo pular.

      – Sra. Smith! – falei em tom de repreensão. – A senhora me assustou.

      – Desculpe – disse ela, embora o brilho em seus olhos demonstrasse o oposto. – É muito difícil encontrá-la em casa.

      – É porque raramente fico em casa – falei, tentando manter o tom leve. – Normalmente, estou na biblioteca. Já mencionei isso antes. A senhora é mais que bem-vinda para me encontrar no trabalho, se precisar falar comigo.

      Zelda fez uma careta. – Eu não leio.

      – Há vários outros motivos para ir à biblioteca. Temos ótimas áreas de estudo. E a senhora também pode ouvir músicas ou assitir filmes. Ou até mesmo fazer uma aula. Temos algumas opções interessantes. Ficarei feliz em lhe mostrar todas possibilidades que a biblioteca oferece. Temos alguns serviços fantásticos – continuei, de forma educada.

      Era inevitável tentar convencer as pessoas à frequentar a biblioteca. No entanto, a minha propaganda não estava surtindo o efeito desejado. Zelda agora parecia ainda menos inclinada a visitar o local.

      – Agradeço, mas não tenho interesse – disse ela, em tom de indiferença. – Queria falar com você sobre a associação de moradores.

      Aparentemente, a missão de vida de Zelda era me pressionar para fazer parte do conselho da associação de moradores do bairro.

      No entanto, isso não estava nos meus planos. Se eu não tinha tempo para plantar uma horta, certamente não teria tempo para participar da associação de moradores. Além disso, vários vizinhos reclamaram comigo sobre o conselho e suas políticas intrusivas.

      Todos concordavam com muitas das regras, como ensacar o lixo, recolher as lixieras após a coleta e manter os pátios limpos. Mas também decidiram sobre a construção de casas. . . se eles tinham permissão para construir um deck ou uma varanda ou até mesmo uma casa na árvore no quintal. Isso pareceu irritar meus vizinhos e foi outro motivo pelo qual eu não queria ter um lugar no conselho.

      – Acho que já discutimos isso, Sra. Smith. Reconheço a importância da associação, mas o conselho merece ter um membro que tenha tempo para se dedicar e continuar a fazer um bom trabalho. Eu simplesmente não tenho tempo para isso. Trabalho em horário integral, tanto à noite quanto nos finais de semana. E não assumo um compromisso a menos que tenha certeza que farei um ótimo trabalho.

      Zelda Smith estreitou os olhos. – É a sua vez, Ann. Sua falecida tia, que Deus a tenha, era uma lenda no conselho. Que dom ela tinha! E tenho certeza que ela gostaria que você assumisse a posição.

      A menção à minha tia foi um golpe baixo. – Não acho que ela gostaria que eu desperdiçasse todo o meu escasso tempo livre, Sra. Smith. Gostaria de poder falar mais sobre esse assunto, mas preciso ir. – Hesitei por um momento. Como bibliotecária, meu único foco sempre foi ajudar as pessoas. Era muito, muito difícil alguém pedir ajuda e eu não colaborar. Então, disse: – Temos um novo vizinho na rua. Não sei o nome dele, mas talvez ele esteja interessado em fazer parte do conselho.

      – Aquele jovem? – A expressão de Zelda indicava sua opinião sobre a juventude em geral. E também mostrou que ela não me considerava parte daquele grupo, embora eu tivesse certeza de que eu e o rapaz tínhamos mais ou menos a mesma idade. – Alguém me contou que ele era DJ. – Ela pronunciou as palavras como se música fosse algo potencialmente venenoso.

      – Não o conheço – acrescentei. – Apenas pensei que talvez valesse a pena contatá-lo. – Peguei minhas chaves e caminhei até a porta da frente com determinação. – Até logo, Sra. Smith.

      Destranquei a porta e a abri com um suspiro de alívio, acendendo algumas luzes ao entrar. O ambiente alegre nunca deixava de me fazer sorrir, as poltronas e o sofá com estofado de algodão, os tapetes multicoloridos e as paredes repletas de livros.

      Optei por um banho rápido, mais para me sentir aquecida depois de ter passado tanto tempo na chuva e ficado com as roupas encharcadas. Vesti uma calça preta e uma blusa cinza com manga três quartos. Prendi o cabelo em um rabo de cavalo frouxo, coloquei pequenas argolas de prata e o medalhão de ouro que sempre costumo usar. Parecia que eu estava prestes a voltar ao trabalho, mas queria usar algo conservador para o encontro que a cliente da bilbioteca havia marcado. Encorajar o rapaz não estava nos meus planos, apesar dos lembretes de Wilson para manter a mente aberta. Pelo menos uma coisa boa aconteceu: a chuva finalmente parou.

      Não pude deixar de suspirar enquanto voltava para o carro. Teria sido tão bom ficar em casa, vestir roupas de ioga confortáveis, esquentar algumas sobras da noite passada e terminar de ler O Alquimista, que de alguma forma, eu nunca tinha tempo de ler. Então, disse a mim mesma para me controlar. Era apenas um encontro e isso deixaria Emily feliz. Além disso, era provável que meu pretendente estivesse tão relutante quanto eu. Talvez fosse algo que nos faria rir. Tentei lembrar o nome dele. Roger. Roger Walton. Repeti baixinho algumas vezes para ter certeza de que estava gravado em meu cérebro.

      Uma coisa que achei bem estranho foi ele ter me convidado para jantar em sua casa. Se havia algo que aprendi durante minha longa e desastrosa experiência de namoro, foi que encontrar alguém para tomar um café ou almoçar era mais seguro. Rápido o suficiente para que você não se sentisse presa, mas longo o suficiente para se ter uma ideia de quem era a pessoa em questão. Isso me fez pensar se Roger não namorava há algum tempo. Talvez tenha se divorciado recentemente ou terminado um relacionamento longo. Emily, sua tia-avó, não havia fornecido muitas pistas.

      Parei em frente a uma casa grande com um jardim bem cuidado. Parecia um daqueles projetos onde constroem uma casa enorme em dois lotes pequenos. O sol tentava aparecer por entre as nuvens, e eu podia ver os tons de roxo e cor-de-rosa do pôr do sol que se aproximava sobre os picos das montanhas. Saí do carro, alisando as roupas e os fios rebeldes do rabo de cavalo. Suspirei enquanto caminhava pela calçada em direção à casa. Emily tinha boas intenções e foi gentil em armar um encontro para nós dois. Mas nunca consegui entender por que todos estavam tão determinados a forçar pessoas solteiras a namorar. Respirei fundo, toquei a campainha e esperei, sentindo um friozinho na barriga.

      Depois de um minuto, toquei a campainha outra vez, hesitante. Eu não queria parecer ansiosa, mas era a hora marcada que combinamos. Não era? Franzi a testa e verifiquei o celular para reler a mensagem de texto, caso eu tivesse enlouquecido. Mas lá estava… Às18h. Na casa dele.

      Talvez a campainha não estivesse funcionando. Bati na porta alguns segundo depois, me mexendo de modo desconfortável e começando a me sentir uma idiota parada na porta por tanto tempo.

      Então respirei fundo. Era cheiro de carvão? Talvez Roger estivesse planejando fazer um churrasco e tivesse esquecido de dizer para eu dar a volta até o jardim dos fundos. De qualquer forma, ele não estava atendendo a porta, então decidi entrar.

      Quando dei a volta ao redor da casa, chapinhando no gramado lamacento, vi uma churrasqueira fumegando… e o corpo do meu pretendente no chão, com um espeto cravado no pescoço.

      Capítulo Dois

      Por um segundo, fique paralisada olhando para ele. Então corri para ter certeza se Roger ainda estava respirando e precisava de ajuda. Não senti a pulsação e vi que seus olhos estavam abertos, o olhar fixo. Respirei fundo, peguei o celular com as mãos trêmulas e chamei a polícia enquanto voltava com cuidado para o jardim da frente.

      Quase de imediato, já pude ouvir uma sirene distante. E depois outra. E outra. Em uma cidade como Whitby, os serviços de emergência não tinha muito o que fazer, então todos compareciam em conjunto para um grande evento.

      Alguns minutos depois, um carro da polícia, uma ambulância e um caminhão de bombeiros pararam em frente à casa, com sirenes tocando e luzes piscando. E segundos depois, todos os vizinhos estavam parados no jardim da frente, olhando ansiosos para a aglomeração. Se eu tinha alguma ilusão de que meu encontro às cegas seria mantido em segredo, agora era tarde demais.

      Apontei para a lateral da casa enquanto o policial corria na minha direção. – Lá atrás